quarta-feira, dezembro 28, 2005

Tumor

Tumor. A palavra é assustadora porque de tantas vezes ter sido utilizada como um eufemismo para cancro, acabou por lhe ficar umbilicalmente ligada.

Pois, mas a verdade é que tenho um. Um tumor. As palavras do dentista deixaram-me num transe meio pânico mas rapidamente explicou que não havia indícios de malignidade. Ou seja, nada aponta para que seja, pois, cancro.

Mas assusta.

Dizem agora que tenho que fazer uma operação em São José. Coisa com anestesia geral. "Implica abrir-lhe o palato e extrair a massa, o quisto"...pois, o tumor.

Assusta, pois assusta.

O médico diz que não corro risco significativo mas que terei mesmo de tratar isto o mais rapidamente possível. Diz para não me preocupar muito, mas para me preocupar. E estou preocupado.

Estou muito preocupado.

Que o pós-operatório será complicado, com 15 dias de "muito mal-estar", o que traduzindo quer dizer dor severa e dificuldades em alimentar-me, que só poderei "comer caldos e alimentos moles". Mas, sinceramente, nem me importo. Quero esta massa fora do meu corpo, este...tumor.

Confesso: estou com medo. Rio, brinco com isto mas estou com medo. "Não há sinais de malignidade." Uma única frase que me dá segurança, mesmo contra a que a completou: "Mas só teremos a certeza absoluta quando abrirmos." Pois...medo.

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Luce vers Tenebrae

Uma carta que não chega (sim, porque ainda há quem escreva cartas), uma foto que assombra uma casa, uma memória que escorre pelos recantos da alma.

O velho inimigo assume muitas formas e tem muitas caras. É por isso que nos apanha quase sempre quando não estamos preparados, quando não dá jeito, quando o seu potencial para nos virar a vida do avesso é maior.

sexta-feira, dezembro 09, 2005

Ídolos com pés de ouro

Portugal parou de boca aberta quando, na quarta-feira passada, Cristiano Ronaldo ergueu bem alto o ded
o médio da mão direita, em direcção aos adeptos que o assobiavam.

Muita gente ficou espantada. Mas perguntol porquê? Houve quem dissesse que se "se consegue tirar o homem das barracas, não se espere que se consiga tirar as barracas do homem". Não vou por aí.

O problema é que quando falamos de futebolistas deste nível falamos, na maior parte das vezes (Rui, és uma brilhante excepção), falamos de jovens com etapas de crescimento obliteradas, com dinheiro a mais, educação a menos e egos sobredesenvolvidos.

Espera-se que estes jovens sejam exemplos de conduta, exemplos de sucesso. Porquê? Porque são excelentes a jogar futebol. Mas mais uma vez a amnésia ataca. São excelentes apenas a jogar futebol. Só isso. Não são ídolos com pés de barro mas ídolos de barro com pés de ouro.

PS: Já agora, um dia destes hei-de vos contar a história de um desses milionários da bola que pediu um portátil de míseros 2500 euros para dar uma entrevista. Não vos digo quem é, apenas que é o mesmo tipo que quando ainda viajava de avião de carreira levava a própria mãe em classe económica, enquanto o próprio viajava confortavelmente instalado em executiva.

quinta-feira, novembro 24, 2005

O sexo dos anjos

Fui recentemente surpreendido por um forum na SIC Notícias subordinado ao tema: "Padres homossexuais". Aparentemente, o Vaticano emitiu um documento a recusar a ordenação de padres homossexuais.

Ora bem, são coisas como esta que me recordam porque é que não sou católico praticante. A distinrta lata destes senhores que se acham no direito de barrar uma qualquert potencial vocação baseados num preconceito ignóbil e profundamente hipócrita. Então e o que fazer aos muitos homossexuais padres? E, já agora, aos outros tantos "Padres Amaros" que aí andam, que mantém relações conjugais não sancionadas?

Falamos de uma Igreja que pretende como assexuados os seus padres, afinal o que interessa se o homem em causa (e o facto de ser só homens também tem que se lhe diga) é heterossexual ou não? Não pode explanar a sua sexualidade, o que, aliás é, isso sim, contra-natura.

Outra curiosidade foi a de uma participação de uma senhora que a Igreja católica poderia impor pré-requisitos para o sacerdócio. O que significa que a heterossexualidade deveria ser um pré-requisito. Para quê? E depois vêm todos os outros preconceitos e disparates que poluem a cabecinha de tanta gente.

Falamos de uma Igreja cujo fundador espiritual quereria para todos os Homens, ou será que quando Ele morreu na cruz "pelos pecadores", deveria ter acrescentados para os cronistas bíblicos: "ah, mas atenção, só os heterossexuais?".

terça-feira, novembro 22, 2005

Democracia oca

A base da democracia é a escolha. Óbvio. Mas para escolher é preciso ter dados. Não se deve tomar uma determinada opção ou enveredar por um certo caminho porque nos parece mais agradável, deve-se optar, isso sim, pelo mais correcto.

Democracia sem conhecimento, e este implica educação, é um sistema sem sangue, sem entranhas; é oco.

No tempo da ditadura, cultivava-se o analfabetismo entre as massas populares como garantia de perpetuação do sistema; hoje o mesmo acontece por desleixo, o que é ainda pior.

O que significa que nas próximas presidenciais damos por pessoas a votar em Cavaco Silva com os argumentos que "o sacana do bochechas está velho, não gosto do Manuel Alegre e o Louçã, sei lá, não conheço". Não, não é ficção mas um diálogo real, daqueles que se ouve, com certeza, em muitos lares daquele que se convencionou chamar o "Portugal real".

Estou farto deste país de ignorantes. Será que além dos sucessivos incompetentes no governo, ainda vamos ter de levar com o Cavaco Silva na presidência?

quinta-feira, novembro 17, 2005

Produtividade

Produtividade. Eis um conceito esquisito em Portugal. Esquisito porque tem muitas perspectivas, dependendo do lugar que se ocupa na cadeia socio-laboral.

Os patrões queixam-se que os empregados produzem pouco e por isso não lhes podem pagar muito.

Os empregados dizem que como são mal pagos não têm motivação nem condições para produzir mais

Os sucessivos governos lamentam a pouca produtividade do aparelho económico português, queixam-se que nos faz ficar mal na estatísticas europeias, mas enfim, como cobram impostos proporcionalmente mais elevados do que no resto da Europa, tanto lhes dá.

Uma pescadinha de rabo na boca: não produzimos, não recebemos, não recebemos, não produzimos. Mas, curiosamente, há algumas empresas que florescem no meio do estrume deste país.

As empresas de Comunicação Social são exemplo mais que perfeito deste peculiar silogismo. Aproveitam o excesso de recursos humanos que as universidades fabricam todos os anos (independentemente da qualidade do ensino, que é invariavelmente baixa, e é-o desde o ensino básico), para poderem manobrar os aumentos de forma indecentemente avarenta. Não lhes interessa a qualidade do produto mas o quanto podem lucrar com ele.

É por isso que se vê tanta barbaridade, tanta falta de qualidade. E não falo em nenhum género específico, pois este é um fenómeno transversal que não poupa títulos, nem sequer os ditos "de referência".

Estou farto de palmadinhas nas costas, elogios e promessas. É oficial, estou a planear uma mudança de rumo. Assistente editorial numa famosa casa livreira parece-vos bem, não?

Vamos ver.

quarta-feira, novembro 02, 2005

Amena cavaqueira

Era uma vez um país que adorava ditadores. Amou um durante 40 anos e teve que esperar que ele caísse de podre para largar cravos nas ruas. O povo desesperou pelo seu regresso durante vinte anos e fizeram-lhe a vontade. O ditador regressou, não numa manhã de nevoeiro, nem do Norte de África. Veio do Algarve, a fazer a rodagem do carro novo até à Figueira da Foz. Aí nasceu o rebento laranja podre e o povo rejubilou.

O ditador reinou durante quase uma década, encheu o país de cimento e de elefantes brancos, mas também apodreceu no lugar. Um punhado de resistentes veio para a rua gritar. Também lá estive a gritar contra uma prova fascista, outros foram para a ponte e o país abanou a laranjeira e a coisa caiu, mais uma vez de podre. Com um tabú pelo meio. O ditador tentou regressar mas o povo não deixou e ele foi para a caverna, esperar.

O século virou, outros poderes subiram à cadeira de onde o primeiro ditador tinha caído. Os homens do governo eram outros, a cor também era outra, mas quem manda são sempre os mesmos.

Agora, o ditador que estava escondido na caverna quer voltar. E o povo, saudosista dos ditadores, parece disposto a aceitar o chicote. Contra ele levanta-se um rei velho, um poeta, um operário e um professor que falça muito alto.

Não aparece ninguém para matar o dragão e a cavaqueira continua, amena, para mais um regresso do ditador. E não há cadeira que nos salve.

terça-feira, novembro 01, 2005

Porque foi inventado o bolo de chocolate

O dia nem começou mal, com aquela confortável sensação de feriado. É certo que venho trabalhar na mesma, mas estes dias têm, ainda assim, um sabor diferente.
Mas depois, sem perceber bem o que se estava a passar ou porquê, a força começou a escorregar. Aquela sensação de estar a mover-me num poço de alcatrão, espesso e negro, invadiu-me. Primeiro, de mansinho, depois, com a subtileza de um martelo a esmagar uma parede de vidro. Ah, pois, é dia de Todos os Santos.
Tenho-me na conta de tipo racional, cristão sim, mas à minha maneira: crente mas sem ligação à instituição eclesiástica, gosto de pensar que cada homem tem um templo em si mesmo. Logo, nem ligo ao calendário religioso. Não? Bem, acho que há coisas que se nos entranham na pele sem darmos por isso, e quando temos tanto da nossa história pessoal do outro lado da linha, é quase inevitável.

Um dia mau, e apesar de ser tantas vezes acusado de ser um fanático de uma dieta que não contempla doces nem outros "bichos", hoje é daqueles dias que percebo porque é que alguém inventou coisas como o Whisky ou o bolo de chocolate.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Sabe bem

Se existisse um "ranking" de profissões ingratas, o jornalismo figuraria de certeza entre as primeiras cinco, sendo que nem me passa pela cabeça quais seriam as outras quatro. Não vou sequer falar dos salários que por aí se pagam (prometi que não ia escrever obscenidades neste espaço sagrado de reflexão), não, vou antes concentrar-me no difícil equilibrismo a que nos obriga esta profissão que não poucas vezes é caracterizada como missão. Missão no sentido religioso mas por vezes também militar.

Encontrar a verdade e publicá-la equilibrando valores como o respeito pela privacidade e o legítimo interesse público é cada vez mais difícil, e há até uma indústria montada na promiscuidade entre a esfera pública e a privada. Mas, enfim...ao contrário do que li há uns tempos, nem todo o jornalismo "é a mesma merda". Há jornalismo e há outras coisas. E se existe a tentação de distinguir o trigo do joio a partir dos títulos, deve dizer-se que a maior diferença faz-se pelos nomes de quem assina e não pela instituição que lhes paga o ordenado. Enfim, há bons jornalistas, há maus jornalistas e há escribas que não são nem uma coisa nem
outra.

"But I digress", o que eu queria mesmo falar era de outra coisa, de outro problema bem mais corriqueiro, mas que penaliza bastante gajos inseguros como eu: a falta de reconhecimento. Nos meus primeiros dias a trabalhar para um diário de divulgação nacional, uma das lições que imediatamente aprendi resumia-se a uma frase muitas vezes repetida: "Não te preocupes se não te disserem nada acerca do teu trabalho, é sinal que estava bom; porque se estivesse mau, então sim, vinham falar contigo."

E assim estive perdido durante alguns anos. De vez em quando recebi alguns elogios, alguns recados de senhores que apesar de não conhecer pessoalmente sabia que teriam importância. Contam-se pelos dedos de uma mão: o dia em que João Marcelino "gostou muito" de um dos meus primeiros trabalhos como enviado especial, um trabalhito modesto nas competições europeias de basquetebol em Valencia. Um elogio que me ficou na memória pelo que significou na minha então embrionária carreira. Já na altura o agora todo-poderoso director do "Correio da Manhã" e director-editorial da "Sábado" era pouco menos que Deus no meu jornal e a sua palavra transformou-me de estagiário despassarado em "jovem promessa". Um estatuto que teimou em permanecer apenso ao meu nome apesar de cada vez menos jovem...

E depois veio a DEZ. Mais que uma revista, um espaço de análise, de comentário e, sobretudo, reportagem, a minha menina dos olhos. Cresci muito neste último ano e meio a trabalhar com uma equipa fantástica. Privar com alguns dos melhores jornalistas desportivos do país e mesmo com aquele que considero o melhor (António Tadeia), permitiu-me crescer e assumir a promessa com que me haviam ungido. Embora o diga sem falsas modéstias que nesta profissão nunca se sabe tudo. Será assim em muitas actividades, mas nesta mais que em nenhuma outra.

Mas sim, no meio disto tudo, sempre a trabalhar e sempre sem reconhecimento, sempre sem a confiança que um crónico inseguro como eu padece, todos os diasa provar que sou bom. A mim e ao mundo. Em cada palavra, em cada parágrafo, em cada vírgula, o jogo entre uma carreira e a prateleira. Não é por nada que há tantos profissionais desta área em consultas na Av. do Brasil...

Uma luta inglória mas que, de vez a vez, tem descanso: quando acabamos um trabalho ou quando ligamos para um conhecido comentador e recebemos do outro lado um "Eh pá, li um seu trabalho muito bom no outro dia. Geralmente nem reparo em quem assina mas neste caso até voltei ao início para ver quem era. Muito bom, sinceramente."

Pois é, às vezes esquecemos os maus salários, as muitas horas e tudo o resto. Porque há dias assim. Sabe bem.

segunda-feira, outubro 10, 2005

Chuva na Frente Oriental

O dia nasceu chuvoso, talvez para limpar a merda que atingiu as nortenhas Gondomar, Felgueiras e a solarenga Oeiras. Em dias como este, acordo com a declarada esperança que a água que cai em barda seja suficiente. Mas nunca é.

Da madeira e ar das colunas da aparelhagem, a guitarra de Jack Johnson materializa-se e deambula sem destino pelas paredes do apartamento, colorindo-as de azul marinho.

Saio da janela e troco a água que cai lá fora pela água quente do chuveiro. Respiro o vapor e o cheiro a lençóis mornos que abandona de mansinho a minha pele.

Pequeno-almoço tomado, hora higiénica no ginásio cumprida e preparo a saída: tiro as peças da armadura têxtil com que vou atacar o dragão quotidiano, recolho as chaves de casa, as chaves do carro, o comando da garagem, o telemóvel, a caneta, os óculos escuros...a parafernália de objectos com que tenho de me armar e saio para a batalha. Para a chuva que não vai limpar tanto esterco.

Já perto do trabalho, o habitual exame dos jornais revela que tudo está na mesma no país. Tudo na mesma na Frente Oriental. E a Leste do Paraíso também.



quinta-feira, outubro 06, 2005

Bob Dylan...sempre actual

Come you masters of war
You that build all the guns
You that build the death planes
You that build the big bombs
You that hide behind walls
You that hide behind desks
I just want you to know
I can see through your masks

You that never done nothin'
But build to destroy
You play with my world
Like it's your little toy
You put a gun in my hand
And you hide from my eyes
And you turn and run farther
When the fast bullets fly

Like Judas of old
You lie and deceive
A world war can be won
You want me to believe
But I see through your eyes
And I see through your brain
Like I see through the water
That runs down my drain

You fasten the triggers
For the others to fire
Then you set back and watch
When the death count gets higher
You hide in your mansion
As young people's blood
Flows out of their bodies
And is buried in the mud

You've thrown the worst fear
That can ever be hurled
Fear to bring children
Into the world
For threatening my baby
Unborn and unnamed
You ain't worth the blood
That runs in your veins

How much do I know
To talk out of turn
You might say that I'm young
You might say I'm unlearned
But there's one thing I know
Though I'm younger than you
Even Jesus would never
Forgive what you do

Let me ask you one question
Is your money that good
Will it buy you forgiveness
Do you think that it could
I think you will find
When your death takes its toll
All the money you made
Will never buy back your soul

And I hope that you die
And your death'll come soon
I will follow your casket
In the pale afternoon
And I'll watch while you're lowered
Down to your deathbed
And I'll stand o'er your grave
'Til I'm sure that you're dead

terça-feira, outubro 04, 2005

Piadinha

Um adepto do Porto chega a uma loja de material desportivo e depara-se com uma infinidade de camisolas de clubes de futebol. Só não via a do seu clube.
Meio sem graça, pergunta ao vendedor:
- Quanto custa a camisola do Real Madrid?
- 50 EUR
- E a do Chelsea?
- Essa custa 75 EUR
- E a do Benfica?
- Oh meu amigo... Essa é a mais cara da loja por se tratar do melhor clube do Mundo, e custa 100EUR.
Aí, o pobre arrisca:
- Você não tem aí a do Porto?
- Tenho sim. Está do outro lado, na prateleira das liquidações e custa 9,50 EUR.
- Pooo!!! Só 9,50 Euros!!!!!!
- É promoção para queima de stock, essas porcarias não se vendem...
- Então dê-me uma - estendendo uma nota de 10 Euros.
O vendedor vai então à caixa registadora, coça a cabeça e meio atrapalhado pergunta:
- Desculpe, mas eu estou sem troco. Quer levar uma camisola do Sporting para completar os 10 Euros?


quarta-feira, setembro 28, 2005

Amor na ponta da pena

Primeiro foram os livros. Desde que me lembro, mesmo antes de aprender a ler, que retiro muito prazer do simples actos de os desfolhar. Logo a seguir, comecei a perceber que até tinha jeito para juntar as palavras, que até tinha coisas para dizer e que, mais importante, as sabia dizer.

Tudo isto para dizer que adoro ler e adoro escrever. Tanto que quando se me proporcionou a oportunidade de fazer o que amo e ser (mal) pago por isso, não vacilei.

Todavia, nos dias que correm, estou a ser atacado pela doença profissional das prostitutas: faço aquilo que gosto, mas faço-o com tanta frequência, a pedido e, muitas vezes num contexo que me diz pouco ou nada, que depois quando o tenho de fazer por amor, falta um pouco a vontade.

Pois, estou a abrir o flanco a piadinhas parvas, eu sei, mas é um risco: confiar.

Tudo isto para justificar a preguiça na contribuição para este espaço. Vamos tentar...prometo.

terça-feira, agosto 23, 2005

Haja saúde

Aproveitando as minhas ainda recentes incursões nos desportos aquáticos, quero dizer aos meus amigos que vou entrar nesta onda: hospitais.

Infelizmente, o meu conhecimento dos hospitais públicos deste país já tem anos. Não por minha causa, que graças aos céus tenho uma saúde de ferro, mas por causa do meu pai.

Os muitos problemas de saúde de que padecia forçaram-me a longas noites nas salas de espera do Curry Cabral. Para não falar nas visitas semanais, sempre acompanhado da minha avó octogenária. E, digo-vos, eram experiências inolvidáveis.

Um hospital não é, não pode ser, um sítio agradável. Mas não acredito que a Ocidente dol Bangladesh e a Norte do Sudão existam hospitais tão maus como os portugueses.

Como passaram alguns anos desde aqueles tempos, e o meu pai já está muito além dos hospitais, cheguei a pensar que as coisas tivessem melhorado. Mas eis que uma ameaça de AVC da minha avó me levaram mais uma vez à sala de espera das urgências do Curry Cabral. A primeira impressão foi de que tudo, afinal, estava melhor. A senhora foi rapidamente atendida e o problema despistado. O pior foi que teve de ser submetida a uns exames.

Para encurtar uma história agoniadamente longa, resumo: estivemos quatro horas à espera da senhora porque a médica que a observou se esqueceu de passar os impressos para uma colheita de sangue. Assim, enquanto a velhota esteve numa maca num corredor, assustada e desorientada, e eu estava na sala de espera, a senhora médica, acompannhada de alguns colegas, conversava e fumava à espera que o tempo do turno se esgotasse. Pois, porque a noite era tranquila e o movimento era escasso. E por isso estivemos QUATRO HORAS depois da primeira observação, à espera de nada. No final, ao constatarem o erro grosseiro, o chefe do serviço disse que afinal as análises não eram necessárias e podíamos ir para casa.

Em suma: quatro horas, QUATRO! para nada.

E o pior é que todos os portugueses têm, pelo menos, uma história destas. Pois é, o país está doente. Terminal. E neste caso sou pela eutanásia.

PS: Segundo um estudo do Banco Central Europeu, e se o actual ritmo de crescimento se mantiver, em 2025 a Espanha será o país mais desenvolvido da Europa, à frente da Alemanha, França ou Inglaterra. Pois é, se ao menos o Afonso Henriques não tivesse espancado a mãe...

sexta-feira, agosto 05, 2005

Danças de fumo

Isto há dias assim. Depois de uma semana preenchida por um dos trabalhos mais difíceis que já levei a cabo na minha carreira (e, de certa forma, dos mais frustrantes), e na antecâmara de uma reportagem de contornos e desfecho ainda mais incertos do que é costume, tenho algum tempo para dar ao "gatilho". Cá vai:

1) Acabou o ballet Gulbenkian. Mais uma demonstração de menoridade de um país em que se desvaloriza a excelência, sobretudo na cultura, onde se gasta milhões nas Casas da Música e nos Centros Culturais de Belém e afins (e não que não façam falta, atenção), e depois se poupam tostões (cerca de dois milhões de euros ano) nos outros edifícios, aqueles de tijolos humanos e que são, afinal, os que mais fazem por essa coisa da cultura. Mas como não dá votos nem enche os bolsos a ninguém...

2) E por falar em encher os bolsos. De cinzas. Esta noite (ou madrugada, para ser rigoroso), quando regressava a casa, dei por mim mergulhado numa piscina de fumo. A cidade de Lisboa inteira e arredores estava mergulhada num manto cinzento que tudo sufocava. Tudo menos a indignação. Há por aí monstros com cara de homem que andam a queimar florestas, casas, o país inteiro. E o que faz o governo? Não sei. O que fazem as autarquias? Não sei. O que faço eu? Também não sei. Não sei o que fazer se não indignar-me. Merda.

3) Finalmente, umas derradeiras palavras para o circo das presidenciais. Digo circoi porque é o que está montado, muito por culpa também da Comunicação Social, que tanto aprecia a política espectáculo, o duelo de titãs. Soares e Cavaco. Bucha e Estica. Lobo e raposa. Resta saber quem é o quê. E no meio de todo este circo quem são os palhaços? Desconfio que nós, os eleitores, que são aqueles que se querem distraídos enquanto se faz aquela política menos vistosa que é, afinal, a que decide o nosso dia-a-dia.

sexta-feira, julho 22, 2005

Reinventar

Estava eu a fazer a habitual ronda pelos blogues dos meus correlegionários quando dei com uma interessante reflexão do meu amigo Hugo Alves (alcateialouca.blogs.sapo.pt)

Primeiro pensei ques estivesse a falar de engenharia genética e reprodução assistida ou algo da área, já que estava a falar de "clones".

Como achei que era um tema pouco "huguesco", perseverei na leitura e acabei com as dúvidas: o meu amigo estava a passar uma sentença sobre as questões do crescimento.

Não sei se ele sabia sequer que era de crescimento que se tratava o texto. Acho que ele até suspeitava, já que fez questão de o negar algumas vezes.

Que não, que não era contra a evolução, que não era contra o crescimento, que não era disso. Pois, mas só é.

O meu amigo diz que não percebe porque é que as pessoas que ele conheceu em tempos estão tão diferentes. Que já não as reconhece. E que por causa disso estarão, necessariamente, piores.

Ora essa amigo! Como acontece na maior parte das vezes, tenho de discordar.

Crescer é evoluir, não de uma forma suave e continuada, mas através de rupturas.

Como escrevi num "post" anterior, e que, suspeito, tem as mesmas raízes do texto do meu amigo, "crescer é violar". Todos crescemos à custa do nosso passado. Todos matamos o pai (ou a mãe, como ele diz) para crescer, todos rompemos com a pele antiga para crescer.

É claro que há quem tente manter as coisas inalteradas, mas é como agarrar areia da praia: mais tarde ou mais cedo, ela escorre pelos dedos e as mãos ficam vazias.

Também tenho nostalgia, é óbvio. Até porque, permitam-me a pretensão, já perdi mais do que a maior parte das pessoas. Porque a vida me fez perder, porque me foi roubado ou até porque, pura e simplesmente, abri mão.

O universo é feito de mudança. Nem sequer o tempo ou o espaço são constantes. Como é que alguém pode ter a pretensão de o ser?

Ok, podem tentar, mas correm o risco de parecer inadequados, um pouco ridículos ou pior.

Agora podia dizer que os dinossauros desapareceram porque não evoluíram. Mas a verdade é que sobreviveram: são aves. Reinventar, amigo. Crescer é reinventar, mesmo que à custa do que fomos.

quinta-feira, julho 21, 2005

Grande Bruce

DARKNESS ON THE EDGE OF TOWN

They're still racing out at the Trestles
But that blood it never burned in her veins
Now I hear she's got a house up in Fairview
And a style she's trying to maintain
Well if she wants to see me
You can tell her that I'm easily found
Tell her there's a spot out `neath Abram's Bridge
And tell her there's a darkness on the edge of town

Everybody's got a secret Sonny
Something that they just can't face
Some folks spend their whole lives trying to keep it
They carry it with them every step that they take
Till some day they just cut it loose
Cut it loose or let it drag `em down
Where no one asks any questions
Or looks too long in your face
In the darkness on the edge of town

Some folks are born into a good life
Other folks get it anyway anyhow
I lost my money and I lost my wife
Them things don't seem to matter much to me now
Tonight I'll be on that hill `cause I can't stop
I'll be on that hill with everything I got
Lives on the line where dreams are found and lost
I'll be there on time and I'll pay the cost
For wanting things that can only be found
In the darkness on the edge of town

quarta-feira, julho 20, 2005

Nú com a mão no bolso

A liberdade é um reino vasto, com muitas quintas. A minha é recém-adquirida: andar nú em casa.

Não há sensação melhor que andar à vontade dentro do meu próprio domínio completamente livre dos empecilhos têxteis. É claro que gosto de roupa e prezo sobremaneira a sua protecção e a enorme possibilidade de expressão que esta nos dá. Mas andar nú faz-nos sentir mais puros e em contacto com a nossa verdadeira Natureza. Ok, e há a insubstituível sensação da aragem na genitália.

Pode parecer um disparate mas depois de viver em casa da mãe até aos 30 anos, com a privacidade obviamente limitada, não há coisa melhor do que poder usufruir deste pequeno grande prazer sem correr o risco de chocar o olhar materno com as (evidentes) alterações que este corpinho sofreu desde que a senhora nos expeliu para o frio do extra-útero.

Mas, e há sempre um "mas". Além de gostar de andar nú, também gosto de ter as janelas abertas. E apesar de não ser um gajo friorento e de estarmos no Verão, acabei por pagar o preço de dormir com o meu fato de nascimento: uma brutal gripe.

Já estou há perto de uma semana a acordar com a garganta dorida, o nariz permanentemente entupido e a voz de uma octogenária cantora de cabaré berlinense reformada.

Estou um bocado farto, mas há quem diga que a maior parte dos prazeres pagam-se.

Pelos vistos, até aqueles que são gozados a sós.





Animais

Essa coisa de ser humano tem muito que se lhe diga. Crescemos a ouvir grandes lições sobre a superioridade moral do ser humano, rei e senhor do planeta e de todas as bestas, mas de vez em quando há coisas...

"Na madrugada de 14 de Julho, alguém entrou nas instalações do canil-gatil de Évora presume-se que por cima da vedação, escolheu dois cães tidos como dos mais agressivos para os gatos, libertou-os das coleiras que os prendiam e abriu a entrada do gatil.
Depois, os cães foram largados e seguiu-se uma horrorosa chacina.
Quando, pelas nove horas da manhã, o tratador dos animais Marco Rebocho chegou às instalações, deparou-se com uma imagem indescritível. Ao ataque só sobreviveram quatro gatas adultas e uma cria. Pelo chão ficaram espalhados pedaços de 15 gatos adultos e crias.
Um dos dois cães envolvidos na macabra luta estava morto de fadiga. Mas outros quatro canídeos não envolvidos na matança apresentaram-se bastante debilitados e acabaram por morrer, aparentemente vítimas de envenenamento..."

in Público de quarta-feira, dia 20 de Julho, por Carlos Dias

Afinal, quem são as bestas?

terça-feira, julho 19, 2005

Cristais de açúcar

Dias de inocência
de açucar polvilhados

Sorrisos cúmplices
de ignorância maquilhados

Abraços fraternos
corações agrilhoados

Crescer é violar

sexta-feira, julho 15, 2005

Dez para as nove e meia

Rasgas o peito e a vaidade
Vestes a fria pele do lagarto
da cor do desgosto
mal curado
As manhãs da vida parecem distantes
e o fim ao virar de uma esquina rugosa
que acena desbragada
dos confins da depressão

Olhas para os espelhos
que quebraste
para as portas que não fechaste
e aumenta a confusão
Os métodos que não seguiste
perseguem-te e tentam
marcar na tua nova pele de
lagarto-da-cor-do-desgosto
o cunho da normalidade

A normal normalidade normalizadora
que é pior que nada, mas o próprio esmagador
nada

Trânsito, filhos, café instantâneo
torradas com margarina fina
que delícia
E os ombros que descaem
E os olhos que embaciam
prisioneiros
do nevoeiro sujo
das palavras sujas
desta vida suja
em que afocinhas
e te esfregas

Os lençois suados de lágrimas
e semen que te puxam para baixo
que te seduzem para o escuro
são a doce armadilha, o intenso mosto
a toca de um homem com pele de lagarto
da cor do desgosto

segunda-feira, julho 11, 2005

(Des)equilíbrios

As férias acabaram. Uma constatação por demais evidente quando te vês reintegrado na monótona procissão rodoviária até à capital.

Enquanto percorria a Segunda Circular, instalado na minha modesta carripana, fui fazendo contas às tarefas que tinha pela frente: esgalhar um artigo sobre a campanha portuguesa de qualificação para o Mundial de voleibol; digerir mais algumas ideias de trabalho, limpar a minha caixa de e-mail e, já agora, acabar com o meu blogue.

Pois é. A verdade é que nunca me senti muito à vontade em despir-me em público. Algo que se tem tornado cada vez mais penoso nos últimos tempos.

Também nunca fui gajo para perder o meu precioso tempo a dedilhar banalidades em cima de generalidades. Se, aqui e ali, o fiz o peço desculpa.

E se digo que me tenho despido em público, a verdade é que este "público" são amigos, conhecidos e alguns estranhos.

O problema é que na vida tudo muda e essas categorias são tudo menos fixas.

Aquele a quem hoje chamas amigo, pode muito bem ser um estranho. Ou então gostarias que fosse. A verdade é que de conhecido, és obrigado a perceber, tem muito pouco.

Tudo isto gira à volta de um conceito escorregadio: o equilíbrio. Palavra que sugere estabilidade, solidez, equidade, a verdade é que, na vida, e no que às pessoas diz respeito, o equilíbrio é tudo menos sólido, mas antes fluido, adaptável.

E é na falta dessa adaptabilidade, que surgem os desequilíbrios. Desequilíbrios de quem não se adapta, de quem não vive bem com a mudança. Porque não tem capacidade, ou coragem, para o fazer.

Confesso que também padeço, por vezes, desse mal. Às vezes desculpo-me com essa deficiência com as circunstâncias atribuladas da minha vida. Mas também quem se pode gabar de ter uma vida fácil? Acho que ninguém.

Assim, bem ou mal, com muitos trambolhões, cabeçadas e hesitações, tiros no pé e muitas segundas oportunidades e ajudas, lá fui levando a água ao meu moinho. Como toda a gente. Ou não?

Uma das razões que me levam a considerar encerrar aqui esta participação virtual, talvez mesmo a mais forte, é perceber que aquilo que deveria ser um espaço de reflexão, de troca de ideias e até, porque não, de tentativas mais ou menos conseguidas de fazer literatura, está a transformar-se numa praça de troca, não de ideias, mas de insultos, de recadinhos (e o diminuitivo refere-se à mesquinhez dos textos e seus autores, e porque não, à menoridade intelectual) e mal destiladas invejas.

Não quero entrar nesse jogo. Não vou entrar nesse jogo. Não tenho feitio nem paciência.

Esta página está com a cabeça no cepo. Como a minha paciência.

quarta-feira, junho 08, 2005

Pés de barro

Durante a vida de um homem, existem algumas questões que pairam insistentes. Nuvens etéreas que, de quando em quando se fazem sentir, como um arrepio...

No meu caso, uma dessas questões tem a ver com...(rufar dos tambores)...os pés.

A primeira vez que tomei conhecimento deste problema fundamental foi graças a uma mulher. Que não gostava dos pés e tal. Desvalorizei. Mas mais tarde voltei a encontrar esse "problema", com outra mulher. Modelo fotográfico, atleta, gira e tal, corpo escultural e...pés feios. Feios? Ela dizia que sim, mas quem estava a olhar para os pés?

E como toda a problemática da pedicultura me foi apresentada por mulheres, cheguei a pensar que fosse uma daquelas coisas de gaja, como a síndrome pré-menstrual e as revistas que dizem coisas como "conquiste o seu homem na cama".

Puro engano.

De repente, ao conversar com alguns amigos daqueles bem machos que bebem cerveja ao litro e curtem futebol, recebi um soco no estomâgo: "Pés? Eh pá, muito importante. Digo-te mais, era incapaz de fazer o que fosse com, deixa ver...a Angelina Jolie por exemplo (silêncio reverentemente religioso) se ela tivesse os pés feios. Só de imaginar uns pés feios a tocar-me..."

Ok, este foi o caso mais extremo. Mas o que é certo é que depois, após apurada investigação, descobri toda uma tribo de adoradores de pés, de amantes de sandálias, de fanáticos dos saltos altos.

Gosto de pensar que sou dotado de apurado sentido estético, logo até distingo o que é isso de um pé bonito. Mas será assim tão relevante?

E as mãos? E os cotovelos? E os pulsos? Sei lá, de repente, todo um universo anatómico pouco explorado se abre diante dos meus olhos. Não como partes discretas bem integradas num todo que se quer harmonioso, mas como elementos valiosos "per se".

Tudo isto porque hoje o 24 Horas trazia na manchete que Daniela Cicarelli tinha "pés feiosos". Sim? e daí?

Será que a beleza, esse valor esguio e vaporoso, depende da "perfeição" (outro conceito perigosíssimo) anatómica de coisas como os pés?

A beleza é uma coisa estranha. Uns perseguem-na obsessivamente, outros não. Uns pensam que são belos sem o ser quando quem o é geralmente nem percebe. Porque a verdadeira beleza não pode depender da perfeição de uns pés. Não pode.

E depois existem ainda outros casos: os daqueles que pensamos que são belos. E, curiosamente, eles também pensam que o são; e vivemos todos nessa entorpecedora ilusão. Até lhes olharmos para os pés e percebemos que são feios...de barro.

terça-feira, maio 31, 2005

Guerra das Estrelas

Estávamos em meados da década de 80, no tempo em que ainda ia a matinées. O local, um cinema da Linha do Estoril. Tinha ido acompanhar a minha mãe numa visita a um familiar e, aborrecido de morte, lá cravei uns trocos para ir ver um filme de que ouvia falar há anos e que estava em reposição. Era a Guerra das Estrelas.

Passaram-se anos desde que me foram apresentados o jovem Luke Skywalker, o rebelde Han Solo, o sábio Obi Wan ou a irreverente princesa Leia.

Sábado passado arrastei a minha namorada para ver o Episódio III da Guerra das Estrelas. Foi a ponte para aquela já distante tarde de 80 e tal.

Foi também uma porta aberta para uma série de questões e temas que me apaixonaram nos três primeiros episódios da série (que também são os últimos, perceba-se lá isto).

A corrupção dos regimes democráticos e dos homens que, afinal, os compõem; o amor, a morte, a relação entre pais e filhos e a redenção dos pais pelos filhos, a proximidade entre os opostos. Conspiração, intriga, fosso de gerações.

E aqui chegamos às críticas que facilmente enchem as páginas da especialidade. Que é incoerente, que existem incorrecções científicas e tecnológicas. Que os robôs não ficavam obsoletos apesar dos anos, se não haveria ecografias ou outro tipo de processos para determinar se eram gémeos ou não, etc, etc, etc.

Pois é. A mania de olhar para as árvores em vez de contemplar a floresta. Amigos, esqueçam as naves, os robôs e os alienígenas. No séc. XVI William Shakespeare escreveu peças com fadas e outros seres fabulosos. Há algum crítico que fale contra o mestre?

Não digo que a "Guerra das Estrelas" seja digna de Shakespeare, mas o homem não desdenharia uma história destas. Só que com fadas em vez de robôs.

quinta-feira, maio 26, 2005

As costas dos ponteiros

Trabalhar em equipa tem destas coisas. E eu odeio. Bom ou mau, gosto de ser responsável pelos meus actos.Depois de amanhã sai uma reportagem/perfil com a vida do treinador José Rachão.

Boa ou má reportagem, não me cabe dizer. Agora, quando um imbecil da revisão troca a expressão "os ponteiros voltam atrás" por um "os ponteiros viram-se para trás"!!! Ai fico irritado, pois claro que fico. É que o nome do imbecil que passou dois dias a compor aquela merda de trabalho está em letras garrafais por cima daquele pedaço de esterco. E o imbecil é, adivinharam, este vosso servo.

Porra! como detesto incompetentes. Assim, amigos, não quero saber dos cerca de 90 mil gajos que lêem a Record DEZ e vão pensar que este Carlos Mariano é um "atrasado mental". Basta saber que vocês sabem que este gajo é mesmo um atrasado mental, ok, mas que sabe que os ponteiros não têm costas.

sexta-feira, maio 13, 2005

Pobre país pobre

-- Ténis para jogar ténis?
-- Sim, eu sei que soa mal mas percebe o que quero dizer, não é?
-- Claro, mas não temos?
-- Não têm? Mas então...?
--Experimente na Sport Zone. É que sabe, o ténis não é um desporto muito...

Este diálogo teve lugar entre mim e um assistente de uma loja dita de desporto no Centro Coimercial Colombo. Antes disso já tinha virado o Vasco da Gama (três modelos de ténis distribuídos entre a loja da Nike e a Sport Zone); o Olivais Shoppping (ah, temos os Adidas Stan Smith [nota: modelo com trinta anos e mais apropriado para passear]) e finalmente o Colombo onde apenas na Sport Zone (e isto inclui a Foot Locker) encontrei alguns modelos, quatro, para ser preciso, e apenas em alguns números. Mais ou menos o mesmo cenário que no El Corte Inglés.

Ok, quem aguentou ler até aqui já se convenceu da frivolidade deste texto. Contudo, não quero aqui falar do drama do menino queque que não conseguia encontrar uns ténis, que hôrrooore!

Não, estou a escrever isto porque nunca tinha sentido tão veementemente o quão terceiro mundista é um país em que se diz que o ténis "é para ricos".

Um par de ténis custa cerca de 50 euros. Uma raquete razoável custa outros cinquenta. Um "pack" de quatro bolas custa cerca de 10 euros. E uma hora num "court" sai mais barato do que uma hora de snooker num qualquer café. Isto é para ricos?

Vivemos num pobre país de pobres...de espírito. Os nossos melhores jogadores de ténis flutuaram algures nos Top 200 mundial. Tivemos um número um de juniores, Cunha e Silva, que aos 18 anos era um ano mais velho que o campeão de Wimbledon da altura, um tal Boris Becker.

Entretanto, acabo de escrever o perfil de Rafael Nadal, um jovem de 18 anos que é o grande candidato a ganhar Roland Garros e a, em breve, ocupar o topo do "ranking" ATP. Ah, e é espanhol. Uma realidade tão próxima no mapa e, no entanto, tão irremediavelmente distante.

Enfim, e isto só me bateu a sério quando quis comprar uns ténis. Incrível.

Em suma:

Viva o país do futebol.

quinta-feira, abril 14, 2005

CCB? -Dêem-nos música

Os cínicos costumam dizer a respeito a política qualquer coisa a respeito das moscas e da merda. Não sei se sim se não.

O que eu sei é que, merda ou não, há coisas que, de facto, não mudam. Há coisa de uma década indignava-me com a "derrapagem financeira" (belo eufemismo) do Centro Cultural de Belém. Mais que o despesismo, criticava um governo que pensava que o evidente défice cultural do país se resolvia com projectos megalómanos.

Muito tempo passou, vários governos se foram com a espuma dos dias, e, no entanto, hoje inaugura-se mais um CCB. Só que como as coisas mudam, este chama-se Casa da Música e é no Porto.

Gaba-se a arquitectura, fala-se das maravilhas que este projecto vai trazer à vida cultural do país, etc, etc.

Só sei que um projecto com orçamento previsto para 40 milhões de euros (oito milhões de contos dos antigos) apresenta hoje uma factura de 100 milhões, ou seja, vinte milhões dos entretanto extintos contos. Pois, porque as coisas mudam...

Posto isto, algumas perguntas:

Quantos teatros se constroem com 100 milhões?

Quantas bibliotecas?

Quantas escolas?

Quantos empregos para
professores, educadores, músicos, actores, se podem criar?

Isto é tudo CCB -- Centralização Cultural para Burros.

Porque a cultura não é isto.

quinta-feira, abril 07, 2005

De carroça

Há um problema grave neste país: a mania de resolver as questões na flor em vez de na raíz.

Um dos exemplos mais óbvios tem a ver com os automóveis. Os automobilistas deste país são a grande vaca leiteira do Estado.

Na aquisição de automóvel, entre IVA e IA, os portugueses são dos que mais se esforçam. Basta dizer que, na Europa, apenas os Dinamarqueses pagam mais para ter carro. Em Portugal o salário mínimo é de 374,70 euros. Na Dinamarca, não há salário mínimo mas recordo-me de ter lido uma reportagem acerca de um emigrante cubano na Dinamarca que ganhava cerca de dois mil euros a servir às mesas. Enfim...

A título de exemplo, um VW Golf 2.0 TDI custa cerca de 10 mil euros mais em Portugal do que em Espanha. 10 mil euros em impostos. Ah, e os espanhóis têm salário mínimo. 526 euros segundo os meus números mais recentes.

Mas há mais. Temos o imposto de circulação (selo), as portagens, a gasolina...

Mas e depois o dinheiro dos impostos é bem aplicado. Em medidas ambientais, em estradas melhores e mais seguras, na melhoria do ensino da condução...pois. Talvez na Dinamarca.

Portagens: Há quarenta anos que os portugueses pagam uma ponte ultrapassada. Fez-se outra, que até desviava o trânsito de uma zona importante da cidade de Lisboa e tal...e é exorbitante.
Para não falar nas auto-estradas. E há alternativas? Pois há. Em alguns casos, as SCUT. Que os senhores do governo cessante queriam cobrar. Que os senhores do actual governo ainda equacionam cobrar.

Gasolina: Os mesmos senhores que queriam cobrar portagens nas SCUT fizeram o favor de liberalizar o preço da gasolina. Como os senhores das gasolineiras até já fazem pouco dinheiro, como até não combinam entre si os preços (cartéis não são só os colombianos), está provado que foi uma excelente medida. A somar a mais impostos, mais que em Espanha, por exemplo, o resultado é o do costume.

Parquímetros: Cobrados por empresas ilegais. Como as pessoas perceberam que a EMEL, por exemplo, não tinha legitimidade legal para passar multas, deixaram de as pagar. Como tal, esses senhores passaram a bloquear e a rebocar carros. Extorsão pura. Mas o que esperar de uma cidade que permite os "arrumadores", senhores que ganham a vida retendo os carros como reféns? Bem, mas a própria EMEL não é mais que uma firma de arrumadores organizados.

Ambiente: E os impostos são usados em medidas ambientais? Pois, tanto que somos o único país da UE que taxa mais a gasolina que o gasóleo (mais poluente).

Estradas: E os impostos são usados na construção de melhores estradas? Para quem já passou no IP4 e IP5 a pergunta é uma anedota trágica.

Mas com tudo isto, chegamos à conclusão. Tive uma discussão com uma amiga que me dizia que o carro é um luxo. É o que pensam os nossos governantes. Eu também pensaria assim se tivesse alternativas. Mas não tenho. Não tenho transportes públicos bons e baratos. Quanto à qualidade, recomendo a leitura do blog "Alcateia de Loucos" onde o meu amigo Hugo Alves faz uma interpretação bem engraçada, mas real, de uma viagem num autocarro da Carris. E para quem vive fora de Lisboa, então...sem palavras.

Mas vamos taxar os automobilistas. Porque o carro é um luxo. Ao preço por que pagamos os carros em Portugal, é mesmo. E, já agora, a relação entre tudo isto e as mortes na estrada? Há a educação e a falta dela. Pois é. Mas isso reflecte-se no número de acidentes. Agora se há muitos acidentes que resultam em morte, se calhar é porque os portugueses quando batem, batem de Renault Clio e não de Mercedes.

Mas de carroça, como o país, a coisa corria muito melhor.

quarta-feira, abril 06, 2005

Vida II

Para evitar confusões, vou retirar todas as considerações genéricas de uma entrada anterior e colocar uma questão "à" referendo: Deve uma mulher que interrompe a gravidez até (digamos) às 12 semanas, sofrer sanções?"

Ou então à bruta: Deve uma mulher que interrompa a gravidez até às (mais uma vez o prazo) ir para a cadeia e ser duplamente castigada (porque o aborto também é uma pena)?

Se se quer evitar o aborto, criem-se condições de acompanhamento nos hospitais, com psicólogos, assistentes sociais, criem alternativas e informem as pessoas da sua existência. Se não se pode criar as condições para toda a gente ter os filhos que quiser, quando quiser então dêem-lhes alternativas. Asseguro que o número de abortos diminuiria drasticamente. E isso é o que todos querem.

Agora, e é só isso que estou a dizer, mandar as pessoas para a prisão é absurdo. A sociedade que promulga e apoia leis como esta é necessaria e implicitamente hipócrita. Não é uma questão religiosa. É uma questão de pão e educação, duas coisas que faltam (muito) neste país.

E para esclarecer os meus amigos comentadores, não sou "bloquista" nem acho que as mulheres sejam as únicas com o poder de escolha sobre o destino do feto. Nunca disse isso. Mas ver no aborto uma forma de "eugenia social" para acabar com os "inadequados" é, no mínimo, um argumento puramente demagógico muitas vezes invocado por aquela franja político-partidária que ideologicamente se posiciona nos antípodas do BE. E os extremos tocam-se e misturam-se. Na máxima expressão tornam-se fanatismos.

domingo, abril 03, 2005

Campeões

Uma recordação da minha amiga e campeã Susana Barroso. Esta grande mulher mostra todos os dias que a vida é uma luta que só se vence...vivendo.
E esses é que são os campeões, os que não se rendem, os que não baixam o jogo, mesmo quando as cartas que o Universo lhes dá são das mais baixas do baralho. Força, esperança, fé, amor. Ainda há quem se lembre o que é isto? É tão triste ver tanta gente imersa nas suas preocupações mesquinhas e sem tempo para agradecer o tanto que têm. A minha amiga Susana Barroso gostaria de ter a mesma força. Mas tem um músculo muito mais poderoso. Mesmo que os médicos digam que vai enfraquecer: o coração. Posted by Hello

quinta-feira, março 31, 2005

Vida

O direito à vida. Eis um conceito mais uma vez em voga.

Em Portugal, discute-se o aborto. Uma questão da qual se diz ser fracturante. Porque todos têm uma posição. Porque ninguém muda de campo. Porque todos acham que têm razão.

E como todos têm uma posição, eu tenho a minha: sou a favor da despenalização do aborto.

Porque sou contra a hipocrisia.

Porque sou contra a injustiça que a actual lei cultiva.

Porque não suporto as senhoras católicas que aparecem nas revistas, vestidas pelas melhores casas francesas e italianas, a pregar sentenças sobre
vidas que nascem ou se perdem num mundo do qual elas só conhecem através dos relatos das empregadas.

Porque há mulheres que morrem ou ficam mutiladas.

Porque há mulheres que têm os corpos invadidos por curiosos armados de instrumentos mal esterilizados, escondidas em quartos sujos.

Porque a sociedade não as deixa sair desses mesmos quartos sujos, penalizando-as, castigando-as por algo a que são forçadas pela ignorância, pela pobreza.

Direito à vida. E Vida será o mesmo que existência? Penso que seja algo mais que isso.

Direito à vida. Acabo de ver o presidente de uma nação responsável por milhares de mortos no Iraque insurgir-se contra a libertação do corpo de uma mulher que há muito havia partido. Como se pode ser tão flexível sobre algo. Só quem não tem espinha o pode fazer.

Direito à vida. Adoro crianças e adoraria, um dia, ser pai. Mas isso tem algo a ver? Só para os ignorantes, os hipócritas ou os burros como George W. Bush.

quarta-feira, março 30, 2005

Escravatura e máscaras de argila

Descansem as mulheres. A igualdade chegou. A parte final do século XIX e todo o século passado foram feitos pela luta das mulheres pela igualdade. Hoje, finalmente, a guerra está a ser ganha.

A ideia bateu-me como um martelo quando dei por mim a ler uma série de folhetos subordinados ao tema da cosmética masculina. Biotherme, Nickel, Lab Series, Clarins, Shiseido, enfim, uma bateria de nomes que entram assim de rompante no meu quotidiano. Eles são os esfoliantes, os hidratantes, os anti-rugas, os cremes de dia, os cremes de noite, e, a minha favorita, a máscara de argila.

Agora sim, estou-me a ver a aspirar a casa, de roupão, num sábado de manhã e com uma máscara de argila no focinho. Só me lembro do teledisco dos Queen.

É verdade que a necessidade é a mãe da invenção, mas o que se passa com este fenómeno é a criação de necessidades. Que homem (ou mulher) precisa de tanta coisa para se sentir bem e saudável? Já para não falar na tanga dos cremes para "adelgaçar a cintura". Pelo amor de Deus! Passei anos a gozar com os cremes anti-celulite das mulheres, um mito para obrigar as senhoras a gastar dinheiro, sem qualquer retorno. E agora querem impingir-nos essas coisas? Valha-nos Deus!

Bem, ao cabo de tanta leitura, fiquei na mesma. O problema é que, de manhã, quando desço no elevador, olho para o espelho e dou por mim a olhar para as linhas dos cantos dos olhos.

Enfim, como as gajas.

domingo, março 20, 2005

Sexo com uma lutadora de sumo

Antes que alguém queira corrigir, eu antecipo: o sumo é só para homens. E ainda bem.

Mas eu explico. À beira dos 30 anos comprei uma prancha. Ontem, na companhia de dois amigos fiz-me ao mar em Carcavelos. Entrei com alguma relutância, a água não é das mais limpas. Mas entrei.

Depois de alguma luta para passar a rebentação, habitual em quem ainda não domina a técnica de "mergulho de pato" e que, portanto, é sistematicamente empurrado pela rebentação de volta à praia, tive a minha recompensa. O mar estava pintado daquele verde-cinza profundo que oscila até ao azul-cobalto. As ondas rareavam mas eram cheias. E algumas, de quando em quando, eram mesmo poderosas.

Estava a falar com um dos meus amigos quando fui surpreendido por uma dessas raras preciosidades: uma parede com franja branca de espuma e uma boca cavernosa. Disse "até já" aos meus parceiros e comecei a remar. A sensação foi a do costume: incrível.

Uma força viva e imensa que pega em nós como um palito de gelado. Mas errei. A trajectória não foi a melhor e passei do topo do edífício para a barriga do monstro. Fui engolido. A prancha puxava para um lado, enquanto as pernas eram empurradas em direcções opostas, dobradas em ângulos impossíveis.

Felizmente, sempre me senti à vontade na água e não entro em pânico. Basta suster o fôlego e esperar que o urso verde se canse de brincar connosco. Subi para respirar e vi que estava à beira da praia. A sensação é de exaustão. Vista "a posteriori" é como fazer amor com uma lutadora de sumo: ora estás em cima e seguro, ou estás dentro e debaixo, quase sufocado naquela enorme massa.

Ah, sim, voltei a remar de volta mas ontem não voltei a apanhar outra onda assim.

terça-feira, março 08, 2005

Dias

Dia da Mulher. Sinto-me na obrigação de sublinhar que nada me move contra as mulheres. Bem pelo contrário.

Aliás, é precisamente por ser a favor das mulheres que me quero insurgir contra o "Dia da Mulher". Depois do dia da árvore, do dia dos avós, do dia da criança, do dia do velho, do dia dos jardineiros e do dia dos comedores de "sushi", eis o dia da mulher.

Essa coisa dos dias de qualquer coisa tem graça e fundamento quando falamos de minorias, o que não é o caso. Que eu saiba, segundo os números mais recentes, as mulheres estão mesmo em maioria.

A existência de um "Dia da Mulher" faz tanto sentido como a de um "Dia do Homem". E não há, pois não?

Enfim, hoje deu-me para aqui, o que fazer. Mas será só a mim que isto faz confusão?

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Também tu, Baía?

Há coisas do diabo. Numa altura em que se fala tanto de boatos e tal...

Bem, que tal darem uma espreitadela a uma certa vivenda na zona de Penafiel? Talvez fiquem tão surpreendidos como eu fiquei quando soube que aí reside a razão pela qual Vítor Baía se separou da mulher.

Ah, e razão faz a barba.

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Terra do Nunca

Ontem fui ver um dos melhores filmes que já tive o privilégio de assistir. "À procura da Terra do Nunca" como lhe chamam por cá é um exemplo magistral de como se pode contar uma história emocionalmente poderosa de forma soberbamente contida.

É raro, mas às vezes tenho de concordar com o meu amigo Hugo.

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Inveja

Recomendo vivamente a leitura do livro de José Gil "Portugal, Hoje: o Medo de Mudar". Li a entrevista que este pensador (considerado um dos maiores 25 pensadores do mundo pelo "Nouvelle Observateur") deu à revista Pública do último domingo e fiquei esclarecido.

"Vivemos paralisados pela inveja", afirma o autor, que coloca este sentimento bem acima desta condição: é algo que faz parte do próprio sangue deste povo.

E, de facto, ao reflectir no que diz José Gil, desde cedo que somos vítimas desta cultura da mediocridade. Desde os bancos de escola, os melhores alunos são reprimidos, marginalizados e só são integrados e aceites quando deixam de brilhar. É a cultura do lodo.

Inveja. Em vez de ganharmos força e motivação com o sucesso dos outros, em vez de procurar imitar o seu exemplo, arrumamo-los com rótulos, insultos, ou a assassina ironia de quem sabe que em Portugal todos vivemos com medo e sensibilidade à flor da pele. Porque este é um país verde, imaturo, sufocado durante anos pelo Salazarismo. Mas não só. É um medo atávico que prefere diminuir os outros à sua própria insignificância.

E é por isso que o país não anda para a frente? Versão Reader's Digest: Sim. Não só, mas claramente também.

quinta-feira, janeiro 13, 2005

O castigo da normalidade

Não há pena maior, castigo mais duro e condição mais desgraçada que a de ser normal. Infelizmente, parece que é a isso que, cada vez mais, estou fadado.

Subi a encosta da vida convencido que seria algo de extraordinário, que a minha vida seria qualquer coisa de marcante e que pairaria muito acima da mediocridade dos "normais".

Mesmo nas alturas em que todo o ser humano reza para ser o mais igual ao seu vizinho, ostentei as minhas diferenças com orgulho, como se a mera inadaptação fosse uma marca de água da grandiosidade que me esperava ao fundo do túnel.

Entretanto, fiz 30 anos, uma data que sugere balanços. Alguns amigos colocam-me a coisa nestes termos: "Tens casa, carro, dinheiro e um bom emprego e uma miúda que gosta de ti. Porque é que dizes que não és feliz? porque é que dizes que te falta algo? Falta?"

Falta. A diferença. Falta a tal marca de água, falta a chama e a crença de que nasci para ser diferente, superlativo.

Estou cada vez mais normal. Cada vez mais presa da normalidade assassina que esfuma as linhas do rosto e a chama dos olhos e do peito, que torna rombas as facas dos dentes.

Tenho trinta anos. Aos quarenta, o animal ressurge, dizem. Esperemos que o acordar da minha besta não se manifeste pela compra de um descapotável.

terça-feira, janeiro 11, 2005

No olho do ciclone

Confesso: estou mal habituado. Moldado ou distorcido por uma maturação complicada, posso dizer que me tornei um vinho encorpado, de cor vermelho-rubi (clubística e politicamente) e um aroma profundo e inebriante, matizado de taninos suaves e um ligeiro sabor persistente a teimosia.

Bem, piadas à parte, sou o que sou, bem ou mal, graças às dificuldades; por não dar nunca nada como adquirido e lutar pelo que quero.

E agora? Agora atravesso um estranho momento de calmaria. Sem dramas, sem dificuldades de maior além das que tento imaginar, estou lentamente a perder propriedades.

Ou se calhar estou no olhbo do furacão, atento à vida que circula transtornada à minha volta. À vida dos outros, porque da minha apenas digo que estou aborrecido. Um bocadinho.

segunda-feira, janeiro 03, 2005

Ano novo...

Aqui está 2005.

Confesso que cada vez tenho menos fascínio por essa coisa do ano novo. É conveniente que haja um calendário que nos lembre da passagem do tempo mas estou a habituar-me a catalogar as gavetas da minha vida em função de eventos marcantes. Talvez porque tenho tido muitos.

Adiante, é apenas uma proposta. Não deve ser das mais práticas, mas nunca fui conhecido por ser prático.

PS: Para alguém que conheço, 2005 é um bom exemplo. Será o ano em que nasce sua filha. Só isso deveria chegar, não?

Parabéns