quarta-feira, agosto 22, 2007

English rose


A natureza humana tem destas coisas: passei a semana em Inglaterra, stressado, a escrever coisas que, sinceramente, já nem me lembro. Diariamente travando um duelo silencioso com o portátil que às vezes parecia olhar para mim, reclamando a minha atenção, como um pequeno ditador, silenciosamente sentado nas várias secretárias dos vários quartos de hotel por onde passei.

Pouco olhei para a paisagem, pouco apreciei esta oportunidade de viajar por um país estrangeiro, de beber a experiência. E é, agora, nas últimas horas, cruzando a verde e chuvosa paisagem de um Agosto que não o é (pelo menos para mim, que me redescubro latino e amante do tempo quente…quem diria), que os dedos me escorregam para o teclado. Finalmente, como uma prostituta que não sendo obrigada pelo dever profissional, redescobre o prazer e o amor.

Hoje em dia já não acontece frequentemente, escrever por prazer, quero dizer… o facto de passar a vida a escrever o que os outros querem acaba por ter esse efeito. Esquecemo-nos do que queremos, nós próprios dizer.
Não sei o que foi que me fez abrir o computador para brincar agora com as letras. Talvez o encanto de uma viagem de comboio pela verde ilha inglesa, o facto de não ter de trabalhar hoje, a perspectiva do regresso a casa ou a cara de anjo desta criança inglesa que está sentada à minha frente.

“Anjo”. Pois. Sou vítima dos arquétipos que me impingem desde puto. Uma lindíssima menina inglesa: não deve ter mais de 14 anos e prepara-se para aquela que é, provavelmente, a sua primeira viagem sozinha. A mãe esperou fora do comboio até ela partir, visivelmente ansiosa e preocupada com a aventura. E o facto de ter dois estrangeiros (sim, não enganamos) sentados à frente do seu tesouro não ajuda. Dois tipos de pele escura (é a primeira vez que me sinto escuro) e barba de três dias não é uma visão tranquilizadora.

Voltemos à criança. Gestos comoventemente inseguros levam-na a guardar os bilhetes de comboio e o passaporte num saquinho plástico. É magrinha como só as inglesas magras sabem ser. Está ainda à espera que as hormonas da adolescência façam a sua magia, mas adivinha-se que vai ser uma daquelas mulheres que provocará muitos torcicolos ao longo dos anos que aí vêm. Os nórdicos olhos azuis e os cabelos louros são mais ou menos vulgares por aqui, mas ela tem qualquer coisa de indefinível… Leva um coração de plástico multifacetado no fecho da mala, um amuleto de criança que um destes dias trocará por corações a sério.
Inocência, é isso. Já não me lembrava como era.
Não ajuda o facto de estar a ler uma revista cor-de-rosa com a curvilínea modelo Jordan na capa, nem as gomas que vai debicando. Quem sabe não se torna um daqueles hipopótamos louros que vi por cá. É impressionante a quantidade de mulheres obesas (e não digo gordinha, é obesa mesmo, na casa dos 100 kg) que andam por estas terras. Os genes britânicos parecem apontar para estruturas ósseas estreitas e longilíneas, mas a alimentação à americana anda a dar cabo deles.
Há outra hipótese: que se transforme numa daquelas desmioladas que também vi: bêbedas como cachos, em grupos de meia-dúzia, desfilando nas noites geladas e chuvosas de Agosto (não, não é engano) com mini-saias até ao pescoço e decotes até ao umbigo.
Espero que não. A imagem da miúda leva-me a outra que nos tem perseguido a todos. A de Madeleine McCann. Não, nem vou entrar por aí. Tenho uma opinião muito própria sobre o assunto e não me apetece sequer começar.

Vou apenas pensar que se as coisas fossem diferentes, esta podia ser a pequena Maddie daqui a uns anos, a viajar num comboio, sozinha, a caminho da idade adulta. Com um coração de plástico na mala e outro, que já foi menos plástico, escondido num peito estrangeiro à sua frente, atravessando a verde Inglaterra em cima de um risco de ferro.

quarta-feira, agosto 08, 2007

Como era mesmo aquele slogan...?


No início dos anos 90, quando me apercebi, tal como a esmagadora maioria dos miúdos da minha geração, que havia uns desportos que não metiam bola e se praticavam nas ondas, a brasileira Lightning Bolt lançava um "slogan" de sucesso: "Destrói as ondas não as praias".


Hoje, no Barbas, um dos meus "spots" de eleição nos dias que correm, essas sábias palavras de um qualquer genial publicitário surgiram na minha cabeça. Estava feliz da vida no pico à espera de umas ondas, quando vejo boiar à minha frente uma garrafa de detergente de lavar louça e outra, de cerveja, que boiava caprichosamente, de gargalo para cima, meio cheia de, suponho, água salgada.


O meu primeiro pensamento, confesso, foi de que a maldita garrafa de vidro podia facilmente partir a cabeça a algum incauto. Leia-se, a mim. Olhei à minha volta e percebi que nenhum dos cem (exagero literário, mas eram muitos) malucos que comigo partilhavam o pico nesta bela manhã de Agosto não desviava o olhar do horizonte, alheio aos objectos que, sinceramente, me estavam a estragar o idílio.


Colocou-se-me um dilema: Ou esquecer a cena e esperar que o mar arrastasse os objectos de forma inofensiva até à areia, ou agarrar na merda das garrafas, apanhar uma onda até à praia, fazer um "slalom" entre os quinhentos (ok, esta não é exagero) banhistas que povoavam o areal e depositar a dita merda das garrafas num contentor apropriado. Ah, sim, e depois remar os cerca de 250 metros contra a rebentação que me separavam do pico.


O dilema durou um minuto. Digamos que se, um dia destes, um amigo vosso vos disser que viu um gajo surgir do mar, empurrado por uma onda, com duas garrafas na mão, não se admirem. Era um anúncio da Lightning Bolt...


PS: Hoje na rádio ouvi que o golfinho branco chinês foi declarado extinto, vítima da poluição. Segundo o folclore local, estes graciosos mamíferos fluviais eram a reencarnação de princesas que se tinham afogado no rio. Os fósseis mais antigos desta espécie datam de há 30 milhões de anos. Habituem-se. A partir de agora, só os poderão ver como fósseis mesmo.

quinta-feira, agosto 02, 2007

Gone Bodyboarding

Só para ver se percebem :)