quinta-feira, dezembro 02, 2004

Justiça

À hora que escrevo estas linhas, corre a notícia, ainda não confirmada, que Pinto da Costa foi notificado na sequência do caso "apito dourado". Dizem ainda que o "Papa" está em Espanha. Azar do caraças!

Ao cabo de 20 anos de roubos declarados, conspirações e todo o tipo de jogadas sujas, o reinado de Pinto da Costa está, finalmente, a chegar ao fim.

Escrevo isto sem ponta de clubismo. Também aplaudiria se LF Vieira fosse preso. Aliás, ainda falta esse. Falo em nome do futebol. Há alguns anos, um presidente do Sporting veio falar do "25 de Abril do futebol"; parece que, finalmente, os tanques estão na rua.

terça-feira, novembro 30, 2004

Viva a Democracia!

quinta-feira, novembro 18, 2004

Intimidade e sim, ovos mexidos

Temos medo. O sexo, mais conhecido nestas páginas como "ovos mexidos" (ver "post" com o mesmo título) é bom. Afirmação pouco polémica. Tão pouco que a sabedoria "hollywoodesca" já a sintetizou: "Sexo é como pizza: mesmo quando é mau, é bom".

Então não é de sexo que temos medo. Ok, concedo que até haja quem tenha medo de sexo, mas isso é uma questão dos que ainda não o começaram e dos que estão com medo que acabe. Coisas do tempo. Daquele que temos e do que ainda nos resta, dependendo da perspectiva.

Mas no meio, entre os inícios e os finalmentes, há os entretantos, os dos ovos mexidos. E é aí que entra o outro medo, o egoísta: medo da intimidade.

O segredo do bom sexo (dizem, que eu não percebo nada disso) é o esquecimento, a anulação da consciência. Esquecermo-nos de quem somos perante outra pessoa; esquecer o pudor, a inadequação. E aí as hormonas ajudam.

O problema é quando passa a "magia" química: nús, umas vezes em cama alheia, outras com alguém que, vendo bem, é praticamente um estranho, estamos paradoxalmente sós.

Lembro-me da história de um amigo que percebeu a real dimensão do erro quando depois de uma noite tórrida, a parceira de idílio erótico o convidou para o seu duche. O problema foi que ele estava urinando e a moça entra casa de banho adentro, sem respeito por aquele momento...íntimo.

Pois é: intimidade. É esse o cerne do problema. É que, nestes dias de propaganda generalizada, de corpos perfeitos enlaçados, o sexo não é, não pode ser, a medida da intimidade.

A intimidade faz-se na partilha de coisas simples mas secretas. É deixar entrar outrém no pequeno e secreto espaço em que nos habituámos a viver. E não é fácil. Para muitos de nós, o proverbial armário onde guardamos os "esqueletos", ou a partilha de uma casa de banho, não é tarefa simples. E é aí, nesse tão menosprezado campo de batalha que se ganham ou perdem relações.

Formulado de maneira sintética: "Posso ir contigo para a cama mas, por favor, não me vejas mijar."

Amén

quarta-feira, novembro 10, 2004

Silêncio de ouro

Parado para obras. Deixei passar as eleições presidenciais norte-americanas, os desvarios governativos do túnel do Rossio, da anunciada taxa para a entrada de automóveis em Lisboa, até do real peso da (alegada) redução das taxas do IRS.

Tudo porque estou em obras.

Quando as coisas mudam bruscamente e o meu mundo parece virado de pernas para o ar (ou finalmente deixa de estar), então mais vale parar para pensar. A palavra pode, de facto, ser de prata. Mas, amigos, em "certas e determinadas situações"...o silêncio é mesmo de ouro.

terça-feira, novembro 02, 2004

Fidel de bolso

Em resposta ao amigo que se insurge contra a minha caracterização da Madeira:

O estilo, em política, é indissociável da sua práxis. E se o estilo de Alberto João é "latino-americano", caro amigo, por sua vez reconhecerá que a política betoneira da "obra feita", tão ao gosto da era cavaquista, não faz mais que esconder as profundíssimas assimetrias de uma ilha dividida entre o Funchal turístico e a "paisagem".

Meu caro, numa coisa eu lhe concedo razão: as falhas da Madeira não serão assim tão diferentes daquelas que todos os dias assinalamos no resto do nosso país, o problema é que a sua insularidade acentua esses problemas. O resto é problema dessa mesma insularidade especial, estimulada por um governo trauliteiro, caricatura de fontismo e cavaquismo. Um regime que parece querer ter pouco de democrático na sua obsessão em dificultar o trabalho dos "patetas da comunicação social do continente".

Quanto ao facto de não terem sido detectadas ou denunciadas fraudes eleitorais, devo dizer que a manipulação de um boletim de voto não é a única forma de viciar umas eleições. Se o meu amigo, como tudo indica, é madeirense, saberá melhor do que eu o que é o caciquismo, já para não falar na demagogia populista e caceteira.

Entretanto, das conversas que tive com alguns madeiren ses sobre o assunto, é voz corrente e crença comum que existe de facto "algo estranho" nas recorrentes reeleições de Alberto João Jardim. Conversas não passam disso mesmo e à falta de provas não lhes posso atribuir grande importância, mas que não deixam de ser sintomáticas.

Em suma, caro amigo, sei que estamos em posições inconciliáveis. Concedo que talvez o povo da Madeira não tenha grandes alternativas ao "Fidel de bolso" Jardim, mas a escolha de um homem que promove o culto da personalidade, do "regionalismo" quase racista (e nesse campeonato também temos o Pinto da Costa) e que capitaliza votos a partir da ignorância de um povo dividido por profundas fracturas soció-económicas, não o dignifica em nada.

E mais uma coisa quanto à obra feita: Tem qualquer coisa de edipiano o "lobbying" feito pelo "presidente da Madeira" (conforme dizia esta semana uma responsável do PSD num lapso inconsciente muito interessante), para conseguir boas fatias do OE e depois apelidar a esmagadora maioria dos portugueses, os que vivem no continente paterno e lhe pagam "a obra feita" com os seus impostos, de cubanos. Mas para um Fidel de bolso o que mais poderíamos esperar?

sexta-feira, outubro 29, 2004

Ilhas

Escrevo estas linhas sentado numa cadeira metálica de um cibercafé do Funchal. O facto de estar numa ilha fez-me reflectir sobre essa condição especial que é a de ilhéu.

Deve ser interessante viver neste pedaço de terra que é português na denominação, europeu na população e latino-americano no regime, sim porque apesar de o tio Alberto nos chamar a todos "cubanos", é ele que tem as tendências "fidelcastrinianas".

Mas fui mais longe. Não sei porquê , ocorreu-me, de forma óbvia e pungente, a doída voz de Paul Simon e o dedilhar da guitarra no tema "I am an Island". Afinal, não o somos todos?

Não somos todos nós ilhéus de nós mesmos? massas de gente cercadas de vazios por todos os lados?

Haverá alguns de entre vós que acorrerão a desmentir-me. Rejeitarão esta tese "fruto dos teus habituados estados depressivos", dirão, arengando com a felicidade que lhes é emprestada por momentos, cientes que ninguém a retirará.

Outros, momentaneamente vencidos pela vida, dirão sem perceberem a mensagem, que sim, que temem que tenho razão, que "tudo é uma merda" e todos os dias assistem impotentes ao desmoronar das ilusões telenovelescas que lhes aqueceram os pés ao longo de anos de novelas da Globo.

"I am a rock, I am an island, and a rock feels no pain, and an island never cries", diz o Paul. Não sei a resposta, apenas tenho perguntas, muitas. É que há algo que nos separa desta ilha e de todas as outras, as geológicas: sentimos dor, choramos, e tocamos. E para além dessas noções quebradiças de felicidade e infelicidade, também somos, nem que seja por momentos, arquipélagos, penínsulas e até, nem que seja por um segundo, enormes continentes de esperança.

quinta-feira, outubro 21, 2004

Misantropo

Misantropo. Para quem não se lembra ou não passou por isso (Sim, que eu não estou a ficar mais novo), esta era uma das palavras que pintalgava a PGA (Prova Geral de Acesso), prova polémica que mandou abaixo ministros da Educação e deu mais uma das muitas facadas no governo de Cavaco.

Tudo isto irrompeu pela minha memória dentro quando vi a carga policial aos estudantes de Coimbra que tentavam invadir (pacificamente, sublinhe-se) o Senado académico. A causa das queixas, desta vez, mais uma vez, são as propinas mas poderia ser outra coisa qualquer, quem sabe, até a PGA.

Quanto a essa prova, devo dizer que até gostava daquilo: não tinha de se estudar e podia-se colocar em acção todo o manancial de conhecimentos que o puto já tinha acumulado aos 17 anos.

Mas era o princípio da coisa, que me parecia algo fascista, que me levou à rua a protestar.

Todavia, nem nos piores tempos da Ferreira Leite e do Grilo na Educação e do Cavaco no governo, vi algo semelhante áquilo que se passou em Coimbra: é o (des)governo Santana em todo o seu esplendor.

Entretanto, e ainda na mesma linha, gostei muito de ver Morais Sarmento assumir a vocação ditatorial deste (des)governo quando em pleno Parlamento advogou que o (des)governo deveria controlar a programação da televisão pública porque "não são os administradores ou os jornalistas a responder perante os eleitores".

Fantástico.

Já agora, porque não colocar o povo a governar directamente? Venha a anarquia e pronto. Sim, porque pela mesma lógica do senhor ministro, não são eles a sentir na pele os efeitos da sua desastrada governação?

Enfim, como se dizia em 92: Cambada de Misantropos

terça-feira, outubro 19, 2004

O Mundo ao contrário

Confesso que nem sou um fã por aí além de Xutos&Pontapés, mas mesmo assim peço-lhes emprestado o título. O mundo está mesmo ao contrário. Cheguei agora de uma reportagem aos Algarves e pelo caminho vinha a ouvir uma notícia que dava conta do interesse de alguns países voltarem a apostar na energia nuclear.

Quer dizer, numa altura em que o petróleo atinge preços brutais e em que se deveria, finalmente, começar a reconverter a indústria e a produção de energia para as fontes ecológicas renováveis, eis que querem voltar ao urânio. Boa, boa, os terroristas agradecem, pois onde é que iam buscar material para bombas? Quanto mais urânio enriquecido houver à solta em países como a China, Coreia(s), Japão e África do Sul, mais fácil é apanhar algum e enfiá-lo na baixa de Nova Iorque, ou Washington ou Londres ou onde lhes apeteça.

Isto para não falar nas questões mais óbvias como as ambientais. Remember Chernobyl? As crianças com malformações e as famílias dos mortos de cancro e leucemia ou os doentes que ainda hoje padecem, lembram-se de certeza.

Um mundo ao contrário é também aquele em que as mães esuartejam crianças no Algarve, em que se morre ou é condenado a morrer no Sudão por não se pertencer à etnia "correcta", ou em que um primeiro-ministro não eleito governa um país que pretensamente integrou o clube das democracias há 30 anos.

Mas o mundo esteve sempre ao contrário. Só assim faz sentido que cá estejamos: para o endireitar, ou morrer tentando. Entretanto, ouvimos Xutos e concordamos.

sexta-feira, outubro 08, 2004

Desculpa Jorge

Quero pedir desculpa. Correndo o risco de emular o velhinho "Perdoa-me", venho aqui oferecer um ramo de flores ao nosso presidente da República, Jorge Sampaio. Sim, porque os homens podem receber flores.

Jorge, quando deixaste que Santana e Cia. ocupassem os assentos do poder, chamei-te nomes; disse que eras um traidor, um vendido, um cobarde. Subestimei-te. Pensei mal de ti e hoje penitencio-me.

Afinal tu, querido Jorge, sabias mais e viste mais longe que nós. Deste-lhes a corda e deixaste-os enforcarem-se. Temos este governo gerido na Kapital há menos de três meses e parecem três séculos. Este governo que consegue fazer de Cavaco Silva um democrata de Guterres um exemplo de competência. Este governo que cala um seu congénere partidário de forma tão suja e desastrada. Este governo que lida com a questão do aborto com luvas de boxe, este governo que faz a gestão de Manuela Ferreira Leite parecer socialmente empenhada.

Do ponto de vista humano e político já fizeram pior do que calar o professor, mas a nível de imagem e relações públicas, amigos...esqueçam

Enfim, mais uma vez, obrigado Jorge. És o maior!

sábado, outubro 02, 2004

O melhor e o pior

Cheguei há pouco tempo de Atenas, palco de sonho e pesadelo para aquele que foi, talvez, o pior e o melhor serviço da minha vida.

Para a história, este evento vai ficar como os XII Jogos Paralímpicos. Para mim, todavia, será bem mais que isso, foi um abrir de olhos.

Dificilmente esquecerei a incompetência dos voluntários que supostamente deveriam ajudar o público e os jornalistas. A sua obtusa teimosia em cumprir ordens até ao paroxismo insensato e ilógico serve como uma lição do que acontece a quem segue ordens e impõe regras sem a clarividência para as contornar que é como quem diz, afinal, sem capacidade para as fazer exercer de maneira inteligente.

Dificilmente esquecerei a colossal indigestão de 10 dias consecutivos a almoçar cachorros quentes e Coca-Cola.

Dificilmente esquecerei as caminhadas quilométricas entre piscina e estádio, agincanadas pelas muitas barreiras de metal que nunca nos deixavam esquecer que foram os gregos os inventores do labirinto.

Dificilmente esquecerei o cansaço pelo abuso de trabalho e as quatro ou cinco horas mal dormidas por noite.

Dificilmente esquecerei o choque inicial de ver pessoas sem braços, sem pernas, sem olhos, competirem e superarem. A si, aos outros, ao mundo, e à minha pena.

Dificilmente esquecerei o aperto na garganta ao ver João Martins debater-se nervosamente na sua pprimeira prova paralímpica, quase que afogando-se em nervos e água.

Dificilmente também esquecerei o outro aperto e a lágrima que não me dei ao trabalho de evitar quando ele ganhou a primeira medalha. Nem tão pouco esquecerei a leve calma que me invadiu quando desci à zona mista para o cumprimentar.

Dificilmente esquecerei os doces olhos de Susana Barroso e a revolta por ter aquele sorriso belo e triste cada vez mais ligado a uma cadeira de rodas.

Dificilmente esquecerei a força, a alegria e o respeito de Carlos Lopes, um atleta invisual primo do célebre maratonista mas muito mais campeão, pela vida, e pela personalidade e desportivismo.

Impossível será esquecer a paixão com que eu e os meus colegas da Comunicação Social nos entregámos a este evento e aos atletas, técnicos, dirigentes e outros protagonistas.

A todos eles levanto uma "Mythos" dourada, amarga e gelada. Um grande bem haja. Em Atenas fomos todos campeões.

quarta-feira, setembro 15, 2004

Antecâmara

Amigos, não ando a escrever nada por duas singelas razões: falta de tempo e falta de clarividência. A bola de cristal pouco transparento que carrego em cima dos ombros anda um pouco confusa. Muita coisa ao mesmo tempo entope o disco rígido. É a antecâmara da confusão. Daqui a dois dias estou novemante de partida. São duas semanas para arejar o sotão.

Vou ter saudades.

quarta-feira, setembro 08, 2004

Mudanças

Finalmente, uma pausa. Não, não vou comer um daqueles chocolates, descansem.

Conforme se percebe pelas mal esgalhadas linhas que espreitam por baixo deste post, fiz trinta anos aqui há dias. Desde aí, as coisas têm mudado a um ritmo avassalador. Estou a braços com a missão portuguesa aos paralímpicos para o jornal e para a revista DEZ. Um "dois em um" que ao invés de me deixar o cabelo suave e brilhante tem-me dado cabo da vida. Trabalho, trabalho, trabalho.

Entretanto, e porque o sonho pula mesmo e avança, já me entregaram uma resma de chaves, sendo que uma delas abre as portas para a minha casa nova e as portas para uma vida nova também.

Uma certa amiga minha admitiu que tinha algum receio que depois de estar instalado iria abrir os olhos e "ainda sentir tristeza". Na verdade, ainda nem consigo definir seja o que for; as emoções são tantas que ainda nem as consegui digerir. Mas mesmo assim, de quando em quando, de entre a torrente um ou outro salmão salta por entre a água espumosa desta cascata de emoções. Quando virei a chave na porta pela primeira vez, quando entrei na minha cama, quando fechei os olhos no silêncio branco do meu sofá.

Tanta coisa está a mudar. Esperemos que eu também seja arrastado na corrente. É isso que espero há muito tempo.

domingo, agosto 29, 2004

Dobrar o cabo

Amanhã completo trinta translacções a bordo da nave Terra. O tempo tem variadíssimas dimensões, tantas quantas as percepções dos milhões de seres que dele têm alguma consciência.
Eu sou mais um. E para mim foi rápido.

Trinta anos. Bolas, é esmagador. Três décadas de amor, desgosto, algum ódio, alguma paixão, alguns medos, algumas alegrias, algumas amizades, algumas desilusões, alguma poesia, alguma aventura, muitas surpresas. Sempre.

Quando dobro este cabo, sinto que na outra costa, a que, quer queira quer não, deixo para trás, fica muita gente. Alguns queridos companheiros que ficaram na praia, uns que chegaram ao seu porto, outros que nem por isso. Um pouco de mim ficou com todos eles. Mas, mais importante, um pouco deles segue comigo nesta viagem. Para a outra costa, para o outro lado da lua, o lado iluminado.

Navego sem carta, confiando somente na orientação dos astros que são também os companheiros de viagem. Uns mais brilhantes que os outros, mas todos com o seu lugar no novo céu que agora despe a película nebulosa da madrugada.

Está uma manhã soalheira. Abro as portas e janelas do peito ao ar salgado. Já se vê a terra nova.

sábado, agosto 28, 2004

Abortem este governo

Hoje é um dia especial para mim, um dia de luto e reflexão. Como tal, nem sequer vinha aqui escrever nada. Mas (e há sempre um "mas"), a indignação e o nojo obrigam-me a vir aqui vomitar um protesto contra a corja de nazis incompetentes que temos a governar-nos.

Estes senhores proibiram a entrada do "Borndeep", o barco da associação "Women on Waves", em Portugal.

Este navio, como sabem, é uma espécie de hospital ambulante que procede a abortos seguros e medicamente assistidos em águas internacionais, ajudando mulheres de países com legislações medievais como o nosso, que criminalizam o aborto.

Esclareço um ponto: Não sou a favor do aborto. Mas ninguém é a favor do aborto. Sou, isso sim, a favor da despenalização do aborto. E digo isto porque a franja da sociedade portuguesa que estigmatiza as mulheres que abortam gosta dessa confusão. "Somos a favor da vida e contra o aborto", dizem. Mas quem não é? E são a favor da vida das mulheres que todos os anos morrem em consequência de abortos clandestinos? E quantas das senhoras "de bem" que dizem isto não foram já a Londres ou Madrid "de férias"?

Enfim, à parte desta discussão que não é nova, está a proibição da entrada em Portugal de uma embarcação com pavilhão de um país da União Europeia. Os argumentos? Saúde pública (que a lei que criminaliza o aborto viola ao enviar muitas mulheres para apartamentos e caves sem condições para executar abortos clandestinos) e a ordem pública, pois temiam problemas e confrontos à chegada do barco a portos nacionais.

Essa lógica da ordem pública deve ser a mesma que durante quase meio-século proibiu manifestações em Portugal.

Ah, e infrigem directivas da União Europeia. Pelos vistos, os criminosos são os senhores Portas e Lopes.

Afinal menti. Sou a favor do aborto. Por favor, abortem este governo.

sexta-feira, agosto 27, 2004

Antigo, sim

Ia responder com mero um comentário, mas dada a veemência de algumas respostas "promovi" a coisa a um post.

Estou verdadeiramente desiludido. Se os meus amigos lerem novamente o post intitulado "o mais antigo desporto do mundo", vão perceber que está encharcado em I-R-O-N-I-A. Um conceito que me é quase tão grato como o S-A-R-C-A-S-M-O. E isto porque sou um cínico, talvez?

Mas, refira-se, acredito mesmo na quase inevitabilidade do tal "adultério" (palavra tão forte que chega a parecer uma obscenidade, nas talvez a intenção seja mesmo essa).

Em suma, se isto fosse um teste, bem...eis os resultados

Sydney, admiro o teu raciocínio e perdoo a precipitação do teu juízo já que não me conheces assim tão bem para perceber a tal ironia. Nota: 9 (com possibilidade de exame em Setembro)

Susana, vejo que não perdeste ainda todo o sentido crítico. Acertaste em todos os pontos que queria frisar e ainda tocaste num ditado muito apropriado que quero desenvolver a seguir. E tens razão, se há amor a sério... Nota 16

Hugo e Paula, caros amigos, muito lestos a atirar os pedregulhos, né? Se no caso da Sydney ela nem me conhece bem e por isso lhe perdoo o erro e o raiocínio dela é bem interessante, no vosso caso...bem, Nota 0,0 para os dois.

Sim, aquele post era também um teste. Vesti a pele de Maria Madalena. Pequena lição de catequese: Maria Madalena era uma senhora de "reputação duvidosa" que ia ser apedrejada quando J.C. (vulgo Messias) passou na sua aldeia. Confrontado com aquela situação, o senhor (em caixa alta se preferirem) disse apenas:

"QUEM NUNCA PECOU QUE ATIRE A PRIMEIRA PEDRA"

E, como toda a gente sabe, e era um dos pontos que eu quis advogar, só não pecou quem não viveu.

quinta-feira, agosto 26, 2004

O mais antigo desporto do mundo

É o mais antigo desporto do mundo. Implica corrida de velocidade, de fundo e meio-fundo, salto em altura da janela dos fundos, pugilato, luta artística em lençóis, tiro (se a coisa correr mal), natação (depende do cenário), além de complexos exercícios de táctica, estratégia, disfarce e (des)ilusão.

Falo-vos do adultério. Quase toda a gente já praticou este antigo e popular desporto de massas. E quem não o praticou vai, quase de certeza, praticar ou conhece alguém que já o experimentou, corre o risco de experimentar ou até que é um profissional olímpico (a proposta para modalidade de apresentação em Pequim 2008 já está em estudo).

Pronto, aqui se levantam as vozes indignadas de todos os meus leitores e leitoras. Bem, de quase todos. Ok, existe o amor e a fidelidade e isso tudo mas, amigos, é só uma questão de tempo.

É certo que falo contra a minha experiência, já que nunca pratiquei tal actividade. Bem, mais ou menos...hmmm...ok, nunca enganei nenhuma namorada, vamos dizer assim. É certo que uma vez ou outra surgiu a oportunidade de me inscrever numa das provas de adultério olímpico, mas sempre optei pela saída mais fácil, ou seja, acabei com a namorada para não a enganar. Limpinho, né? Honesto, certo? Errado.

Porque é que temos de magoar desnecessariamente a pessoa com quem estamos por causa de algo que, na maior parte das vezes, não passa de "desporto"? Exactamente, salto em altura da janela das traseiras, luta artística nos lençóis, ah...malabarismo com o registo do cartão de crédito (apenas para amadores, pois na alta-competição usa-se dinheiro vivo, "cash", espécimen"...vocês sabem o que eu quero dizer).

A monogamia é uma bela realidade, ok, não estou a dizer o contrário, mas para manter a saúde de uma relação, temos de, de vez e quando, saltar a cerca, certo? Certo...bem, quase.

Como quase os desportos ou medicamentos (porque o adultério pode ser terapêutico), há contra-indicações:

a) Nunca brincar com isto num momento em que a relação está fragilizada

b) Nunca o fazer com amigos do casal

c) Nunca, mas nunca o fazer se ainda não se sabe distinguir sexo de amor

E FINALMENTE, A MAIS IMPORTANTE:

d) Nunca o fazer se se ama a pessoa com quem se está. Perceberam? Mas também, quem é que acredita nisso do amor, né?

Férias

Férias. Uma palavra que normalmente se traduz em destinos mais ou menos exóticos, quartos de hotel, monumentos, viagens, aviões, comboios, carros e afins. Em suma, movimento.

Pois, mas não desta vez. Estas férias, para este gajo, significam estar perto de casa, acordar cedo, ir ao café da esquina, fazer compras no supermercado da vizinhança, estar com os amigos ou simplesmente estar, ou seja, o contrário de ir.

É que de há alguns anos para cá, o meu trabalho obriga-me a fazer tudo aquilo descrito no primeiro parágrafo. E férias deveria significar o contrário da rotina de trabalho, porque mesmo quando essa rotina parece excitante para o comum dos mortais , acreditem, pode ser rotina.

Ou seja, estou por cá. E sem dor de dentes :)))

sábado, agosto 21, 2004

Home sweet home

"I'm baaack!" Uff! Depois de uma semana a aturar a birra do Del Neri e a escavar no passado de Trapattoni, eis-me de volta a casa. Digo-vos, há sensações muito boas nesta vida, mas aquele momento qem que o avião toca com todas as rodas no asfalto da pista da Portela...inigualável.

Ok, viajar é bom e tal, e desde que comecei a trabalhar para a revista (DEZ aos sábados com o Record, comprem!) posso gerir melhor o tempo e até, imagine-se, fazer algum turismo. Mas amigos, é trabalho, nunca é a mesma coisa.

E depois, vamos confessar, adoro o meu país, as minhas coisas, este ar atlântico, esta atmosfera meio celto-romano-árabe que nos faz únicos.

E é por isso que me irrito tanto com ele e com o que poderia ser de bom se não tivesse tanto de tão mau. Mas enfim, depois acusam-me de querer mudar o Mundo. Sim, mas um bocadinho de cada vez. E este bocadinho de Europa era um bom princípio.

Enfim, estou de volta. Por pouco tempo, já ouvi dizer. Mas ainda tenho uma semanita de férias para estar aqui. E começo a gostar muito de aqui estar. Só isso.

quinta-feira, agosto 19, 2004

Sexo e ovos mexidos

Quando me falam de hotéis, há duas coisas que me ocorrem imediatamente num exercício de livre associação que gostaria que comentassem: sexo e ovos mexidos.

Uma associação que não é assim tão disparatada, já que ambos são húmidos e saborosos. Ok, mas só os ovos mexidos são amarelos, eu sei. Se acham que não, então vão ao médico...rapidamente.

Não, a verdadeira razão para esta associação é que sexo e ovos mexidos são duas coisas que habitualmente só consumo em hotéis. Ok, nos bancos de trás de carros também (e nos da frente, já agora). O sexo, os ovos não que me deixam nódoas nos estofos. Pois, o sexo também, mas são mais fáceis de limpar. Acho.

Estão a ver? já estou baralhado. Tanta coisa em comum como é que não
hei-de os associar?

A verdade é que este post está viciado à partida. É que estou num hotel há três dias e enquanto bato nestas teclas, dois moços, um moço e uma moça, já agora, estão a fazê-lo no quarto ao lado. Sexo, não ovos mexidos.

Como é que sei isto? É difícil não o saber. Mais, pagava para não o saber, mas pagava muito mais para não os ouvir.

Como qualquer homem que se preze, sou burro. Asinino e inseguro. E gosto de saber que a miúda que está comigo não preferia estar a fazer qualquer coisa de mais interessante como ver a programação da manhã da RTP ou verniz das unhas a secar. Sim, gosto que suspirem, que gemam, que gritem até um pouco,admito. A subtileza não é o nosso forte.

Agora, coisa bem diferente é estar perto de um matadouro em actividade. E a senhora urra que nem uma desalmada, Ok?! É uma coisa impressionante. Vim para o quarto depois de um dia de trabalho, esperando relaxar um bocadinho e ler enquanto espero pelo jantar e sou assaltado por uma sinfonia de urros.

Sexo e ovos mexidos. Ambos são húmidos, saborosos e pouco elegantes. É um facto: dois seres humanos no auge da paixão não são nunca uma coisa elegante. Há suor, esforço, respiração ofegante e desordenada, fluidos corporais em abundância e em trajectórias imprevistas e imprevisíveis. O sexo é caótico. Tal como os ovos mexidos.

Estão a ver? Uma associação simples. Bem, enquanto estava concentrado a fazer esta bela análise, os senhores acabaram.

Mas ainda falta uma hora e tal para o jantar e estou com apetite. Será que o serviço de quartos me arranja uns ovos mexidos?

terça-feira, agosto 17, 2004

Cine Citá

Bene, esta é uma estreia, o meu primeiro post "estrangeiro". Escrevo-vos de Itália, de Milão mais precisamente, para onde me desloquei em trabalho durante uma semanita. Sim, anocas, o tal café terá que esperar mais um pouco.

Mas tirando a conversa fiada, que hoje já estou farto de escrever, queria apenas deixar um curtíssimo pensamento, melhor, uma descoberta:

Amigos, os itallianos são apenas portugueses com "soldi", qiue é como quem diz na língua de Petrarca, dinheiro, massa, tostanito.

Ok, as italianas (ou italianos, conforme os gostos) são muito atraentes e tal. Mas apenas alguns exemplares que foram bafejados com genes do Norte e Leste da Europa e que são altos e de olhos verdes e tal. Mas, vendo bem, também temos exemplares desses portanto, insisto: o povo italiano é apenas uma versão novo-rica dos portugueses.

É claro que são pobres quando comparados aos alemães e aos suecos, mas têm uma coisa: um talento latino para gastar o dinheiro. Tratam-se bem, vestem bem, comem bem, vivem bem.

Bolas, quanto mais venho a este país mais me convenço: para o bem e para o mal, é o que temos de mais parecido com o velho "Portogallo" e o único país da Europa que conheço (e já são uns poucos) onde era capaz de viver. Viva a Itália.

PS: Desculpem a superficialidade do texto, mas é um desabafo mal parido num dia em que já não consigo arrancar melhor da carola. Beijinhos e até ao meu regresso.

quinta-feira, agosto 12, 2004

Bem-vinda

Apesar de nunca termos sido formalmente apresentados, gostaria de anotar a presença da elefanta mais leve do mundo virtual.

Bem-vinda ao meu mundo, Sidney

Só para ti

Quero aproveitar este espaço para dar uma resposta personalizada. Cá vai, só para ti:

Cara amiga, apesar das sempre citadas confusões que abalaram a nossa existência comum, gostaria de te lembrar que, apesar de tudo, e das mudanças próprias da vida, uma coisa se mantém inalterada: a minha propensão para o oito ou oitenta, o rosa e o negro. Nunca fui homem de meios-termos nem de neutros. Compreendo a tua intenção e sei que foi boa. Mas apesar de tudo aquilo que nos une (ainda?), convém lembrar que é essa minha incapacidade de ser "neutro" que nos separa. Mas, minha querida, não te preocupes, pois eu já aprendi a respeitar isso em ti. Agora tens tu de "perdoar" o contrário em mim.

E eu sei que já te disse, mas não mudava uma palavra. Hoje.

quarta-feira, agosto 11, 2004

O sorriso sem memória

Eu tento esquecer. A dor, não o sorriso, a ternura, a alegria contagiante maior que a própria vida, tão curta.

Eu tento esquecer. A dor. Mas como esquecer quando acordo ao som do choro da mãe? A tua, a nossa. Quando o choro se propaga, qual manada ferida pelas paredes da casa? A casa de onde quero fugir, pois já não é casa mas túmulo?

Eu tento esquecer. A dor. Mas hoje é o dia em que nasceste, o dia em que os gritos de dor de tua mãe, que é a minha, anunciavam a tua chegada e não a dor da tua partida.

Eu tento esquecer. A dor. Mas as tuas fotos cercam-me, esmagadoras. O teu sorriso assombra-me. E eu gosto dele. Adoro a memória do teu riso malandro de criança que nunca envelhecerá. . Adoro a tua voz que quase fugiu da minha memória, como uma pegada que a maré está prestes a roubar, uma onda de cada vez.

Eu tento esquecer. Hoje fui comer com os meus amigos, com os amigos que são os teus. Não importa onde estejas, serão sempre os teus amigos. Levantámos os copos em tua memória. Muitas vezes. Tantas que agora sou obrigado a corrigir cada palavra que escrevo. Mas não importa. É que de outra maneira não conseguia. Custa muito. Custa nunca mais ver o teu sorriso malandro nem ouvir a tua voz dizer "mano". Nunca mais ninguém me chamará "mano".

A nossa mãe grita. E eu também, cá dentro. Silencioso. Mal afogado numa garrafa de tinto caro. Tenho saudades, mano. Nunca mais vejo o teu sorriso.

terça-feira, agosto 10, 2004

Feriado encarnado

Hoje tenho de vos privar de uma das habituais pérolas de sabedoria com que encho estas páginas. É que joga o Benfica e tenho de vestir a camisola e saltar para cima da mesa aos gritos: GOLLLLLO!!!

segunda-feira, agosto 09, 2004

Ponto cruz

Ela estendeu-lhe o quadro. "Leva isto. Assim como assim é para deitar fora". A moldura não era grande mas ele já tinha um caixote nos braços e não podia aceitar, por isso eu agarrei o pequeno quadrado. Acho que antes de o fazer já sabia o que era, mas, mesmo assim, fi-lo, e quando olhei para o que estava emoldurado arrependi-me de imediato. "Amo-te Rui", eram as palavras desenhadas a azul bebé em ponto cruz.

Era uma recordação de tempos idos. A data, qualquer coisa de 1995, não deixava margem para dúvidas e ali estava, como uma recordação de um amor e certidão de óbito do mesmo. Um documento redigido a ponto cruz, para a posteridade.

Continuei a ajudar a levar as coisas da casa que em tempos ambos habitaram, mas com um luto estranho que era por eles e por mim. Não foi a primeira vez que ajudei o meu amigo a levar a cabo esta triste tarefa, mas entristece-me sempre; é como levar os objectos de um morto, escolher e separar a triste herança de uma relação que faleceu.

É trágico, sobretudo porque acredito que ainda gostam um do outro. É duplamente trágico porque sinto que ainda gosto dela. Mas lá estou outra vez a falar de mim. Mas é que quando os vejo, novamente juntos e, no entanto, tão separados, não consigo deixar de pensar no que me... não, no que nos sucedeu.

Não levei o meu amor tão longe como o Rui o fez, não tive a sua coragem. Não, não estou a ser justo. Nunca tive os meios e quando estava perto de os ter, aí sim, não tive coragem. Fugi. Tive medo de viver um momento como aquele que o meu amigo estava a viver, sem me aperceber que, no fim de contas, era tarde de mais. Fugi do amor e matei-o, ou pelo menos gostaria que assim tivesse sido, mas não sei. No fundo, acho que ainda tenho de viver com o fantasma dessa criança mal-nascida, de uma vida que podia ter sido e não o foi porque tive medo.

Agora vivo com esse fantasma que todos os dias é cada vez mais isso, um fantasma, ténue e vaporoso, cada vez mais sem substância, sem cor, sem cheiro, porque as memórias vão perdendo o seu perfume. Mas como as flores secas, ainda tropeçamos nelas quando folheamos as páginas de um livro antigo. De memórias.

Sim, ainda a encontro por aí, num carro que passa, num amigo comum, numa qualquer alusão ao que faz, a quem é, ao que podia ter sido. Vejo-a nos caminhos que trilhámos juntos, nos locais que conhecemos, em tudo o que fizemos, e, muito mais, no que não.

Não, não tenho um quadro de ponto cruz. Só mesmo a cruz.

sexta-feira, agosto 06, 2004

Tigres e Leões

A Natureza é a melhor cartilha que o divino professor nos deixou. Está repleta de exemplos e sábias alegorias sobre a melhor maneira de nós, macacos pelados, conduzirmos as nossas vidas.

Hoje gostaria de vos falar sobre tigres e leões. Os primeiros levam vidas solitárias, camuflados entre a densa folhagem do jangal, usando as riscas que lhes decoram o dorso como sombras ou sulcos de escuridão.

Os outros, os "reis" da selva, vivem rodeados de um harém de fêmeas que caçam para eles, os alimentam e lhes parem a descendência. Indolentes, só têm duas funções: defender o território e espalhar a semente.

Solitários e gregários, tigres e leões.

Crises

Uma cara amiga "acusou-me" de estar a atravessar a "crise dos 30". Esclareço: não sou um homem de modas; não de moda, que até aprecio enquanto arte, mas de modas. E a tal crise dos 30 cai no patamar das questões mais prementes que afligem a geração dos filhos de Abril, e como tal...é moda.

Outro esclarecimento: não é a crise dos 30, mas o fim das crises. Passei pela crise dos 6, a crise dos 10, 11, 12, e 13, prossegui com crises até aos 18, depois tive a crise dos 21 e, provavelmente a mais grave, a dos 25. Depois, foi o arrastar de uma pequena crise cozida em lume brando, com pequenos picos de forma, até aos 29. Agora estamos a falar, finalmente, do fim da crise.

Ou seja, último esclarecimento: Minha cara, não é a crise dos 30, é o fim do túnel, o fim da crise em letra grande. Existe apenas o tal inconveniente: sem passado para me desculpar tenho que começar a assumir os meus erros pelo que são.

Chama-se crescer.


quinta-feira, agosto 05, 2004

Calor

Odeio o calor pegajoso-tropical que me cerca como um muco asfixiante. O mundo parece estar em modo "slow motion"; a água que de cinco em cinco minutos pulverizo na cara evapora quase imediatamente como se tivesse sido vertida em cima de uma chapa quente. Não consigo respirar, a garganta envolvida pelas garras de um urso.

Não fui feito para isto. A cegonha que me trouxe via Paris enganou-se rotundamente ou então foi abatida por um qualquer caçador "tuga" e largou a preciosa carga (leia-se eu mesmo) nos braços de minha mãe. Devia ter nascido na Suécia, cidadão de primeiro mundo e, mais importante, no fresco e retemperador clima nórdico, com verões curtos a vinte e tal graus.

quarta-feira, agosto 04, 2004

Um alegre funeral

Após anos de tentativas falhadas, chegou a hora do funeral. Finalmente vou matar o Carlos. Aquele que durante quase trinta anos deambulou nas trincheiras de uma existência mal vivida vai morrer. Há anos que tento, mas faltava-me a bala de prata, a estaca, o interruptor. Mas agora, quando pousei o corpo de Carlos na nova cama de Carlos, na nova casa de Carlos, percebi que já tenho a arma na mão e basta apertar o gatilho.

Assim, quando chegar a primeira noite, um Carlos vai-se deitar e um outro Carlos se levantará. Será, como diz a letra de Sérgio Godinho, "o primeiro dia do resto da tua vida". Vai ser muito duro matar Carlos, afinal são já quase três décadas de um matrimónio forçado, mas o mais difícil será viver sem desculpas.

Carlos sem Carlos terá de começar do zero. Chegou a hora de reinventar Carlos. Que a nova criança seja feliz.

terça-feira, agosto 03, 2004

Farto!!!

Como costuma dizer um caro amigo, "Estou que nem posso!" Está um calor impressionante, tenho uma porcaria de um texto de 2 mil caracteres para esgalhar, e não tenho qualquer paciência para sequer começar. Não consigo arranjar uma forma de entrar no tema; para todos os efeitos, estou a sofrer de impotência literária. Eu não sirvoi para isto. Não sou uma máquina que debita um texto quando é preciso. "I'm not a number, I'm a man!!"

Uma outra amiga dizia-me em tempos que não me via como jornalista, precisamente, porque não me via capaz de escrever a metro e a toque de caixa. Raios parta se ela não tinha razão!

Mas como ainda não tenho um dedo mínimo de escritor tenho que me prostituir assim.

sábado, julho 31, 2004

Mortos que andam

Não, isto não é o argumento para um filme de terror série B, só que não sei como descrever aquelas pessoas que vemos todos os dias passearem-se pelas ruas e pelos corredores das empresas, nas filas do banco, nos "guichets" das repartições públicas, e em todos os becos mais escuros da nossa existência.
Algumas trazem pastas de plástico a imitar cabedal, sorrisos de plástico a imitar vida.
Sabem, afinal enganei-me, isto é mesmo o argumento para um filme de terror. Tenho medo do silêncio que escorre de dentro do espaço vazio das palavras que sopram as bocas vazias de beijos e cheias de dentes. Tenho medo dos seus apertos de mão flácidos e dos olhares interessados que passam directo por aquele espaço ainda sem nome entre o meu ombro e a minha orelha. Tenho medo da sua política de direita, a intelectualidade de esquerda, e a moral indecisa de "zigue-zague". Tenho medo dos seus parceiros "Ken" e as suas parceiras "Barbie" e das suas crias rebentos de carne-plástico.

É aquela estranha sensação de ser a única mente sã dentro de um manicómio ou uma ovelha extraterrestre de visita a um matadouro. Olho para as filas das minhas irmãs imaculadamente brancas à espera de depositar a cabeça no cepo e o sangue na tina. Confrontado com este estranho cenário, sacudo a minha lã irrepreensivelmente negra e viro costas, afastando-me cada vez mais dos balidos tristes do rebanho.

Um conselho às restantes ovelhas: sejam lobos.

quarta-feira, julho 28, 2004

Contra-relógio

Parto para Esposende para fazer uma reportagem com a selecção nacional de voleibol. É sempre bom reencontrar um excelente grupo de atletas no qual tenho a honra de ter também alguns amigos.
Mesmo assim, e apesar de ser (quase) sempre um prazer ir em reportagem, desta vez sou obrigado a fazer um autêntico contra-relógio. Explico: A reportagem é amanhã, quinta-feira, e tenho de estar de volta na manhã de sexta, mais precisamente na minha casa, na Quinta da Piedade (bonito nome não?) para acompanhar uns senhores que lá vão depositar mobília. Esperemos que não seja preciso entrar em excessos de velocidade...

Não queria morrer sem ver os primeiros passos daquilo que vai ser o meu lar.

terça-feira, julho 27, 2004

Saber viver

"Quando um homem sonha, o mundo pula e avança", escreveu um dia o poeta António Gedeão. Não é bem assim, pois o Mundo pula e avança quer sonhemos ou não. O que acontece é que as mudanças às vezes nos apanham a sonhar ou pura e simplesmente a dormir.
Vem isto a propósito da discussão entre dois velhos amigos, divididos entre dois lados de uma barricada que não é mais que a própria vida.
Não sou professor de ninguém , mas considero-me um bom aluno. E uma das razões que me fez bom aluno foi a capacidade de ouvir. Não trabalhava muito, mas ouvia. E sem ser professor, gostaria de dar um conselho: ouçam.

E ouçam a vida e um ao outro. A vida porque mudou. E um ao outro porque há sempre razões que a razão desconhece e a primeira luz surgiu quando alguém se lembrou de bater uma pedra na outra.

Mas, enfim, apenas um desabafo. Porque apesar de a vida me ter afastado qualquer coisa de um e muitíssimo do outro, creio que no meio da torrente heraclitiana que é a vida, em que coisa alguma é a mesma e na qual nunca há regressos, gosto de pensar que há uma ou outra coisa que, sendo mutáveis na forma, devem permanecer a mesma no conteúdo.  

Como eu. Como todos nós. Os anos passaram e mudámos todos; para o bem e para o mal. Mas sem sermos os mesmos, no fundo, ainda o somos.

 

quinta-feira, julho 22, 2004

Ah pois é...

Não gosto de dizer "I told you so..." mas aqui vai na mesma: "100 milhões de euros de dívida aos fornecedores da CMLisboa" noticiava há dias o Público. Não quis escrever nada contra o senhor Santana Lopes porque já adivinhava que alguma coisa se iria passar nos dias mais próximos. Ah pois é...a senhora secretária de Estado da Defesa, que já foi da Segurança Social e, afinal, surpresa das surpresas, é agora do Espectáculo e das Artes. Paulo Portas, surpreendido com a troca de última hora, diz que a senhora Teresa Caeiro é muito competente, "perguntem ao Bagão Félix". Que é gira é, agora competente (?)...sempre ouvi dizer que não há quem toque bem tantos instrumentos. Se eu quisesse ajavardar (longe de mim!!!), dizia que com uma boca tão bonita podia concentrar-se  mais em instrumentos de sopro.

terça-feira, julho 20, 2004

Vergonha

Acabei de ler uma entrevista que me deixou genuinamente nauseado. Uma entrevista que foi à prensa pela revista FOCUS e na qual dão direito de antena ao meu caro amigo e antigo colega Freddy Vinagre e a um tal de Mário São Vicente. 
O objectivo da entrevista é ouvir dois profissionais de publicações ligadas à análise dos media, a "Meios e Publicidade" e a "Briefing", sobre o panorama do jornalismo português.  
 
Para já, penso que a escolha dos entrevistados foi um pouco pobre, afinal falaram com dois jovens profissionais sem nome na praça e com relativa pouca experiência para se pronunciarem sobre toda uma realidade complexa, o que faz a coisa resvalar para algo pouco mais relevante que uma conversa de café. Ou seja, se eu quiser falar sobre o futebol português não vou entrevistar o Carlos Mariano ou outro repórter qualquer, mas um director de um jornal desportivo de referência.
 
Neste caso, e porque falamos de jornais e revistas, porque não entrevistar o responsável governativo por essa pasta, ou um painel de directores de jornais e revistas, ou alguns empresários do sector. Ou até todos estes. Estamos a falar de uma reportagem mais vasta e não de dois pares de páginas com dois gajos porreiros que a gente até conhece dos tempos de faculdade.
 
Enfim, mas um caso não são casos, e não vou entrar em críticas canibalísticas, sob pena de estar a incorrer no mesmo erro que o senhor entrevistado Mário São Vicente. É que no meio dos muitos disparates proferidos pelo senhor no dito trabalho, houve um trecho que me fez entrar em parafuso: "O grande problema do jornalismo em Portugal são os jornalistas: têm baixa produtividade, são preguiçosos. As redacções são verdadeiros antros de jornalistas incompetentes que ocupam os seus lugares graças a uma rede de contactos."
 
Quando leio isto, ocorre-me uma frase muito acertada: "As generalizações são mentirosas". Ora este senhor está a generalizar e corre o risco de estar, pura e simplesmente, a mentir. É claro que o que ele diz é parcialmente verdade, também há maus profissionais, mas se vamos rotular toda uma classe, então sinto-me ofendido no meu brio profissional.
 
Então e os muitos escribas trabalhadores e dedicados, com qualidade, sub-valorizados e mal pagos, vítimas de alguns empresários que os senhores entrevistados tanto elogiam.
 
E depois lembrei-me: então o senhor Mário São Vicente não é jornalista? Não deve ser. Ou é um tipo muito frustrado que não sabe ou não pode ser mais nada.
 
Enfim, haja paciência para tanta mediocridade.
 
PS: Freddy Vinagre, um dos entrevistados, é meu amigo. Mas não é por isso que não deixo de o criticar. Mas apesar de ter caído no erro de vaidade de falar de algo sobre o qual, repito, não pode emitir mais que uma opinião válida para uma conversa de café, não diz os disparates que o outro otário diz. Enfim, jornalisticamente falando, e a minha opinião vale o que vale, a entrevista da FOCUS é (e perdoem-me o vernáculo), uma cagada.     

quinta-feira, julho 15, 2004

Até já

Amigos, peço desculpa por um pequeníssimo interregno mas vou fazer uma pequena incursão à serra de Bornes. Voltamos a falar no sábado. É só trabalho.

quarta-feira, julho 14, 2004

Revolução já!

Adiei pronunciar-me sobre este facto para não pejar este espaço nobre com vernáculo do pior. E embora ainda não saiba bem como o fazer, vou tentar:

Como disse em tempos o imortal e rotundo João Pinto (o primeiro, o "bilhas"), estávamos à beira do abismo e demos o passo em frente. Eu gosto de Jorge Sampaio; do estilo britânico, dos discursos em português algo esquecido e, sobretudo, da emotividade e até da lágrima fácil que nos une no solidário clube daqueles que trazem sempre o coração demasiadamente perto da boca. Até hoje só havia uma mancha no pano imaculadamente limpo da minha admiração pelo nosso ilustre presidente da República: uma tomada de partido pelo "relativismo cultural" que protege a excepção legal aos touros de morte de Barrancos. "Relativismo cultural" que, recorde-se, é o argumento utilizado pelos governo da República da China para justificar a tortura, a pena de morte, etc.

Mas agora o tal pano quase limpo foi mergulhado na lama e no esterco mais sujo e mal-cheiroso. Jorge Sampaio traiu a democracia, o seu cargo e todos os valores do pós-25 de Abril, os mesmos que, ironicamente, defendeu na sua juventude. Parece que se comprova a tese que na juventude defendem-se princípios e na velhice os fins.

E é mesmo o fim. O presidente da República é escolhido por todos os portugueses, consoante o espírito e a letra da Constituição. Ora, a decisão que Jorge Sampaio tomou face à fuga de Durão Barroso para debaixo das quentes penas da galinha-Europa foi vergonhosa e apenas defendeu alguns portugueses, os donos dos grupos económicos que nos sugam o sangue ea juventude a todos nós.

Basta ver a pressão que o presidente e maior accionista do grupo Cofina, Paulo Fernandes, exercia em declarações ao Correio da Manhã, pronunciando-se contra a dissolução da Assembleia da República e convocatória de novas eleições. Ora, para quem não sabe, a Cofina é o grupo proprietário do...Correio da Manhã.

Jorge fez-lhes a vontade, deu o flanco em prol da "estabilidade económica". Mas agora pergunto: que estabilidade vamos ter com Pedro Santana Lopes e Paulo Portas a mandar no país? Começamos bem com a proposta peregrina de "descentralizar" a administração pública e dos ministérios. Mas é só o princípio.

Quanto a mim, parece-me que voltámos atrás no tempo, ao 24 de Abril. E, sinceramente, apetece emigrar.





terça-feira, julho 13, 2004

Frenesim mobiliário

Quero pedir desculpas antecipadamente pelo meu comportamento do próximo par de meses,pois entrei em frenesim mobiliário. Passo a explicar: estou a uma semana e tal (espero) da assinatura da escritura da minha barraca e agora só penso em maneiras de a encher de tralha. Ele é camas, ele é sofás, cadeiras, tapetes, copos, talheres, mesas, mesas de cozinha...Meu Deus, estou a dar em doido! (ar ensandecido, rasgando a roupa e dando saltos em cima das mesas da redacção)

Ok..humpf...desculpem. Bem, a verdade é que o meu lado de gaija está a latejar. Perdi dias à procura de uma cama, delicio-me a ver lojas de mobiliário e decoração e até já fui ao Ikea, imaginem. Não sei onde isto irá parar.

Por isso, já sabem: se por acaso vos convidar para ir ver uns móveis, fujam. É um conselho de amigo.

PS: Halo quê, miúda? Desculpe, senhora miúda.

sexta-feira, julho 09, 2004

Advogado do diabo

Há muita coisa que não percebo. Porque é que, por exemplo, passo tanto tempo a fazer de advogado do diabo; porque é que estou sempre a defender aqueles em que o povo adora bater. Talvez porque tantas vezes é o meu rabo que está sentado na cadeira dos réus... Enfim, alguns amigos acusam-me de estar a concentrar-me nos alvos errados. Talvez. ´Não escolhi levar a vida que levo, mas escolhi vivê-la a fundo. Não escolhi perder o contacto com pessoas por quem nutro a mais profunda afeição, o que é certo é que algumas simplesmente também parecem ter escolhido ir para águas menos profundas. É a minha deriva que as afasta ou é a deriva dos (in)continentes? Não sei. Mas também não sei tanta coisa.
Vozes especializadas dizem que optei por uma existência demasiado centrada em mim mesmo, que "tenho um medo dos afectos que até faz impressão". Talvez, não nego. Mas, lá está, foi uma escolha que algumas pessoas fizeram por mim. Pessoas que, curiosamente, também levam uma vida centradas nelas mesmas. Mas nisso ninguém repara. Pois, o diabo mais vermelho é que é o verdadeiro diabo.

Exmo. sr. dr. Juíz, "I rest my case"

get it... "Anonymous"

PS: Ah...e Su, ensina a Anocas a assinar os comentários, por favor

quarta-feira, julho 07, 2004

Estou vivo

Em 15 dias, voei de ultraleve sobre as lezírias ribatejanas, flutuei de paraquedas sobre o mediterrâneo grego e desci cascatas em "rappel" no rio Teixeira. Falta um mês e mais qualquer coisa para completar 30 anos e nunca me senti tão vivo. A 28 de Agosto de 1999 fiz uma promessa: ia começar a viver, viver mais, desse por onde desse. A dor abriu em mim uma incomensurável fome de vida que quase me ia destruindo. Não se pode saciar certas fomes quando ao mesmo tempo damos socos para partir os próprios dentes.
Passou a fase da confusão, chegou novamente a altura de morder, devorar.

Faltam mais 15 dias para um novo começo

quarta-feira, junho 30, 2004

Laranjada

Ok, estou de volta. Agora vamos lá espremer essas laranjas!

sexta-feira, junho 25, 2004

Sem palavras

Estou triste. Pesaroso por não ter palavras para poder narrar toda a bela história que vi ontem ser contada pelos homens de vermelho e verde vestidos. E até por aquele de cinzento que trazia o sangue mais vermelho e a esperança mais verde. Foste grande, Ricardo.

Mas pronto, chega de falar de futebol. Neste momento, estou a fazer os preparativos para ir passar dois dias a Corfu. Enfim, é mais ou menos trabalho, mas coisa ligeira. Regresso no dia de Portugal, dia 30 de Junho, em que, mais uma vez, os nossos rapazes levarão mais longe o nome de Portugal.

PS: para as vozes sem nome, eu só escondo o meu quando o meu interlocutor me conhece até à medula e sabe bem com quem fala, olhos nos olhos. Por isso, para os anónimos inomináveis, um recado: eu confio em mim, porque pelo menos eu assumo as minhas decisões e sigo-as até me provarem enganado. Esta é uma excepção, a próxima vez que quiserem uma resposta identifiquem-se, porque eu gosto que se dê os nomes aos bois.

quinta-feira, junho 24, 2004

De mãos limpas!

Para todos os que massacraram esse grande benfiquista chamado Ricardo, apenas uma questão: Vitor quê?

E chega

Só uma breve declaração: Vamos ganhar!

sábado, junho 19, 2004

Remember Aljubarrota

Amigos, está a chegar a hora em que esta malfadada "geração de ouro" do futebol português (os pernas-de-pau do Mundial de 66 não interessam para nada, pois não?) vai encontrar o seu destino.
É uma hora de desígnios nacionais. Foi a pensar neste momento que D. Afonso Henriques bateu na mãe e que o Conde de Andeiro foi pontapeado pela janela fora. Amigos, egrégios avós, poetas, marinheiros...compatriotas, estão a tocar os sinos a repique e o clarim de guerra chama-nos para o campo. Qual Europa qual carapuça! Vamos fazer "nuestros hermanos" engolir caramelos!

Ah, e Luís, só aqui entre nós, faz de conta que és português do Laranjeiro e não madridista dos sete costados e vê lá se marcas um golito. É que já não me lembro de te ver jogar à bola como jogavas antigamente. É que eu vejo poucos jogos do Real, sabes?

E quanto ao resto do Europeu, quero lá saber, eu quero é ganhar este jogo,carago! (translation: carago -- mithical war cry normaly used by the northern portuguese tribes and with reasonable success)

Remember Aljubarrota! Viva Portugal!

quarta-feira, junho 16, 2004

Descobrimentos

A poucas horas do encontro com a Rússia (que por acaso, até acho que vamos ganhar), importa aqui fazer uma reflexão. Assisti com algum pasmo à proliferação de bandeiras e bandeirinhas verde-rubras por todo o lado. É curioso este povo português que há 500 anos vive à sombra dos feitos de meia-dúzia de grandes heróis. Ok, fomos os maiores...há meio-milénio, ok?! Não vemos os Estados Unidos puxar sistematicamente pela chegada à Lua, pois não? E estamos a falar de um país com pouco mais de dois séculos de história, ao passo que Portugal tem oitocentos anos de herança às costas. É bom o amor pela pátria, mas o amor reflectido, diário, traduzido em actos, em produtividade.
A nossa selecção nacional de futebol é um bom exemplo de portugalidade, de um país que perdeu duas oportunidades históricas de ser realmente europeu: o plano Marshall, uma mão estendida dos vencedores da II Guerra Mundial e que o nosso querido Oliveira Salazar preferiu rejeitar; e os fundos estruturais da União Europeia que o outro querido Cavaco não soube administrar.
Louve-se a paixão deste povo pelos ditadores. É normal, ou não fosse este um país sem pai, fundado por um rei que celebrou a sua fundação batendo na mãe. Mas isso Freud explica.

Eu amo este país. Amo Portugal como um homem que vê o país refém de uma montanha de problemas e que a quer desfazer. Todos os dias agarro na picareta e tento desbastar o enorme rochedo, cuspindo nos capatazes que se intitulam nossos governantes e esperando, ingenuamente, não estar sozinho na luta. O problema é que há uns dias parei, levantei a cabeça enquanto limpava o suor da testa, e constatei que ao meu lado, em vez de picaretas, o povo empunhava bandeiras. É bonito,mas mesmo que a nossa selecção de futebol chegue à final,(e porra! é só futebol!)o que farão às bandeiras no dia 5?

sábado, junho 12, 2004

E quando a bola rola

Falta pouco mais de meia-hora para o pontapé de saída do Portugal-Grécia, o jogo de arranque do Euro'2004. Há algum tempo que cultivo um certo desprezo pelo que é "popular". Desconfio sempre daquilo de que toda a gente gosta. Como diz o poema, às vezes ir pelo caminho menos frequentado faz toda a diferença. E há um grande perigo na embriaguez das multidões, no esquecimento do indivíduo varrido pela irresistível maré das massas. E lá vão as crises, lá vai a escassez, lá vai o desemprego, as contas por pagar, o ordenado que não estica e a pobreza que espreita. Lá vai o défice democrático, o crime que aumenta, a confusão que grassa. É o apelo do circo, sempre mais forte quando rareia o pão.

É perigoso esquecer. Mas vou abrir uma excepção. E quando o Pauleta marcar o primeiro golo vou festejar. Porque às vezes sabe bem embriagarmo-nos de esperança...90 minutos de cada vez.

quarta-feira, junho 09, 2004

Er(r)os

Errar é humano, diz-se por aí. Quanto a mim costumo dizer é que se este axioma for verdadeiro, então não há gajo mais humano que eu. Tenho uma amiga que diz que eu gosto de me colocar na linha do comboio, vejo-o chegar e, mesmo assim, sou incapaz de dar o passo ao lado que me salvaria.
Recentemete tentei salvar-me. Ou melhor, redimir-me. Ou melhor ainda, redimir a parte do erro que me cabia. Não foi dos maiores que já cometi, tanto que ainda hoje penso se o que cometi foi mesmo um erro. O que é certo é que já passou tempo de mais e o mundo mudou tanto desde que certas palavras (não) foram ditas...
Mas como estava a dizer, tentei a redenção: voltei a falar (comunicar é mais exacto) com alguém de quem gosto e respeito. Alguém que mudou muito mas que, acredito, mantém o essencial.

Assim, como prova de amizade, isto é para ti: fôr, compôr, expôr, amôr, estupôr, louvôr, cantôr, furôr, mentôr, sabôr

terça-feira, junho 08, 2004

Lugares comuns e mulheres

Adoro lugares-comuns. Existe uma sabedoria comprovada naquelas expressões nascidas já não se sabe onde mas que à força de repetição parecem pulular por todo o lado até à quase omnipresença. Como jornalista que trabalha num diário desportivo, tropeço em pérolas destas todos os dias pelo que de tanto as repudiar acabei por lhes ganhar um estranho afecto. Mas é uma relação enquinada, um pouco à imagem do que se diz de algumas mulheres: brincamos com elas até se nos colarem. As mulheres são sempre uma boa analogia. Para tudo. Seres tão maravilhosos e complexos que até nos esquecemos que são da mesma espécie biológica. Mas serão mesmo? Quanto mais as conheço mais duvido. Mas no final só dá vontade de fazer rolar outro lugar-comum: não se pode viver com elas mas também não se consegue viver sem elas.
Na minha vida conheci dois grandes ramos dessa fabulosa família de belos mamíferos bípedes tão semelhantes ao homem: as mulheres que nos amam e as que nós amamos. Para mim, a grande diferença entre as duas famílias é o movimento. As primeiras precisaram sempre de uma força externa (eu) que lhes imprima a energia necessária para que saiam da minha vida; as segundas, animadas de uma presença de espírito invulgar vão sempre pelo seu próprio pé, em velocidades variáveis mas com destino inexoravelmente definido e definitivo. Por vezes penso se não será por elas saírem que as amo. O amor pela perda e pelo irreversível é tão lugar-comum e, ao fim ao cabo, tão português.

sábado, junho 05, 2004

O princípio

Não posso deixar de dizer que começo este blog com muitas reticências; não gosto de me expor. Contudo, estou farto de viver com demasiados pensamentos cruzados (a estática mental é insuportável) e esta talvez seja a melhor maneira de exorcizá-los. Esta é uma época de novos princípios; chegou a altura de abrir as gavetas.