sexta-feira, outubro 29, 2004

Ilhas

Escrevo estas linhas sentado numa cadeira metálica de um cibercafé do Funchal. O facto de estar numa ilha fez-me reflectir sobre essa condição especial que é a de ilhéu.

Deve ser interessante viver neste pedaço de terra que é português na denominação, europeu na população e latino-americano no regime, sim porque apesar de o tio Alberto nos chamar a todos "cubanos", é ele que tem as tendências "fidelcastrinianas".

Mas fui mais longe. Não sei porquê , ocorreu-me, de forma óbvia e pungente, a doída voz de Paul Simon e o dedilhar da guitarra no tema "I am an Island". Afinal, não o somos todos?

Não somos todos nós ilhéus de nós mesmos? massas de gente cercadas de vazios por todos os lados?

Haverá alguns de entre vós que acorrerão a desmentir-me. Rejeitarão esta tese "fruto dos teus habituados estados depressivos", dirão, arengando com a felicidade que lhes é emprestada por momentos, cientes que ninguém a retirará.

Outros, momentaneamente vencidos pela vida, dirão sem perceberem a mensagem, que sim, que temem que tenho razão, que "tudo é uma merda" e todos os dias assistem impotentes ao desmoronar das ilusões telenovelescas que lhes aqueceram os pés ao longo de anos de novelas da Globo.

"I am a rock, I am an island, and a rock feels no pain, and an island never cries", diz o Paul. Não sei a resposta, apenas tenho perguntas, muitas. É que há algo que nos separa desta ilha e de todas as outras, as geológicas: sentimos dor, choramos, e tocamos. E para além dessas noções quebradiças de felicidade e infelicidade, também somos, nem que seja por momentos, arquipélagos, penínsulas e até, nem que seja por um segundo, enormes continentes de esperança.